segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

SEXO E DESTINO - LIVRO DE CHICO XAVIER

 CONTINUAÇÃO

CAPÍTULO 10

Precedendo o descanso, entendi-me a sós com Félix, que me aprovou o desejo de continuar prestando assistência a Nogueira e à filha.
Cientificara-se o instrutor de todos os sucessos em curso, mas solicitava minudências. Ouviu-me a exposição, preocupado, e deduziu que as dificuldades de Cláudio e Marina atingiam o clímax.
Necessário apoiá-los, socorrê-los. Mediante os compromissos em que se emaranhavam, impossível alinhar previsões.
O benfeitor falava sereno. Para mim, porém, muito fácil verificar-lhe o suplício oculto. De quando em quando, lágrimas lhe umedeciam os olhos, que ele, padrão de coragem, não chegava a derramar.
Mesmo assim, contendo a emotividade, sugeriu providências e articulou planos. Que eu voltasse, encetando a nova etapa de assistência, junto de Marina, em Botafogo. Apreciava em Moreira um cooperador diligente que o tempo se incumbiria de valorizar; todavia, supunha trabalho complexo demais para ele sozinho o encargo de manter a jovem doente livre dos vampirizadores, cujo número aumentava com as atitudes inesperadas de Márcia, estimulando Nemésio a uma aventura que ralava pela demência. Que me reunisse, desse modo, a Moreira, alentasse Marina, estendesse
os braços para Cláudio e, quanto nos fosse possível, amparasse Márcia e os dois Torres, sempre que nos propiciassem os meios para isso. Prometeu que nos acompanharia, confiando na Bênção do Senhor, que a tudo prevê e provê nas horas justas.
Compreendi. Félix sofria conformado. Chorava por dentro.
Acatando-lhe as instruções, no dia seguinte dispus-me ao retorno.
Antes, porém, de empreender o regresso, porque me interessasse pelos assuntos de sexo e penalogia, refletindo nas enfermidades obscuras que enxameiam na Terra, o próprio Félix conduziu-me, de passagem, a pequeno palácio, localizado no centro da instituição. “Casa da Providência”, esse o nome com que o edifício é designado. Curioso foro do “Almas Irmãs”, onde dois juizes funcionam, atendendo aos petitórios formulados pelos integrantes da comunidade, com respeito aos irmãos reencarnados na esfera física.
De entrada, faceando com dezenas de pessoas que iam e vinham, Félix, sempre cumprimentado com apreço por todos os passantes, explicou-me que ali somente se organizavam processos de auxílio e corrigenda, relacionados aos companheiros destinados à reencarnação e aos que já se achassem no estágio físico,
espiritualmente ligados aos interesses do instituto.
Renascimentos, berços torturados, acidentes da infância, delitos da juventude, dramas passionais, lares periclitantes, divórcios, deserções afetivas, certas modalidades de suicídio tanto quanto moléstias e obsessões resultantes de abusos sexuais e uma infinidade de temas conexos são aí examinados, segundo as rogativas e as queixas entregues aos pronunciamentos da justiça. A Casa da Providência apenas delibera em definitivo nos problemas que se
limitem ao “Almas Irmãs”; contudo, os casos, em maioria, revelam derivações para outros setores. Nessa hipótese, as questões são aí discutidas, de começo, seguindo para instâncias superiores.
Ainda assim, os dois magistrados amigos e ele mesmo, Félix, que é constrangido pela força do cargo a estudar e informar todas as peças, uma por uma, não decidem só por si. Um conselho constituído por dez orientadores, seis companheiros e quatro irmãs, com méritos suficientes perante a governadoria da cidade, opina, através de assembléias semanais, em todas as recomendações e diligências, aprovando-as ou contrariando-as, a fim de que as decisões não se comprometam em arbitrariedades. Alegou, talvez por humildade, que, em muitas ações, fora esclarecido muito mais pelos pareceres dos juizes e dos conselheiros que pelo próprio critério, o que lhe fornecia dobradas razões para respeitá-los.
Clareando com mais segurança os informes iniciais, voltou a esclarecer que mais da metade dos autos tramitam na direção de autoridades do Ministério da Regeneração e do Auxílio que, aliás, primam pela rapidez nos despachos e provimentos.
No corpo do edifício, seguimos por vias interiores, no rumo do gabinete central.
Félix, que se achava ali unicamente para favorecer-me, não se atribuía o direito de penetrar, intempestivamente, no salão de audiências públicas, onde a massa de requerentes e querelantes se acomodava. Alguns talvez lhe dirigissem apelos pessoais, no intuito, embora vão, de pressionar os julgadores, inconveniência que era preciso evitar.
Em recinto sóbrio, o instrutor deu-me a satisfação de saudar o juiz Amantino, que se achava em serviço, acompanhado de cinco auxiliares. Ambiente digno, em que a direção e a subalternidade não se confundem, conquanto reunidas pela cordialidade na base do acatamento recíproco.
A chegada de Félix provocou afetuoso tumulto que ele próprio suprimiu, avisando que se tratava de contacto ligeiro. Apenas uma vista de olhos. E frisou que eu voltaria, mais tarde, com tempo bastante para engolfar-me no estudo.
Os colaboradores retomaram posição. Amantino, porém, pelo jeito, queria ofertar-nos alguns minutos de atenção, que era forçoso receber.
Sentamo-nos.
Mais para corresponder à gentileza que pelo propósito de analisar de afogadilho os mecanismos da casa, que exigiam aturada consideração, perguntei pela percentagem dos companheiros que regressam, absolutamente irrepreensíveis, da existência terrestre,

CONTINUA AMANHÃ

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