amiga íntima e em cujo apartamento costumava telefonar, quando inevitável. Levantou-se, algo reanimada, para a busca de condução; entretanto, somente aí deu pela falta da bolsa que largara na fuga. Faltava o dinheiro, mas não desistiu. Acenou da calçada ao primeiro táxi disponível. Consultou o motorista se lhe podia fazer o favor de atender, com pagamento à porta de casa. Estava sozinha
e esquecera-se do horário, O profissional correto notou-lhe a tristeza e o acanhamento. Compadeceu-se. Alegou que recusava, sistematicamente, conduzir pessoas que encomendavam serviço, criando problemas; entretanto, no caso, faria exceção e aquiesceu.
A breve trecho, seguíamos, junto dela, para Copacabana.
No endereço indicado, saltou, fez-se acompanhar pelo condutor ao apartamento da amiga, sendo recebida com a lhaneza que esperava. Segredou, envergonhada, para Dona Cora que se achava em apuros, se ela não dispunha, naquela hora, de algum dinheiro para emprestar. Pagaria no dia seguinte. A dona da casa, espontânea e bondosa, não titubeou... Abriu pequena gaveta e falou sorrindo: “só quatrocentos cruzeiros”. O marido não estava. Marita, reconhecida, explicou que a importância bastava. Depois da corrida paga, disse para a senhora que andara em serviço extra, fora em seguida ao Leblon visitar um doente, afetando que somente naquele instante conseguiria tomar o ônibus para casa. Antes disso, porém, tinha necessidade de um telefonema. Conversação com pessoa muito íntima. Dona Cora cedeu-lhe a peça inteira e acrescentou, gentil, que ia arranjar um cafezinho. Falasse à vontade, ninguém a interromperia. As duas filhinhas dormiam, há muito, e o esposo que substituía um colega, no trabalho, não regressaria tão cedo. A dona da casa afastou-se para a cozinha, isolando a sala.
E, ali, diante de nós, sem que nos percebesse, de leve, os corações solidários, Marita discou, sofreando a emoção de modo a fantasiar a alegria da outra.
e esquecera-se do horário, O profissional correto notou-lhe a tristeza e o acanhamento. Compadeceu-se. Alegou que recusava, sistematicamente, conduzir pessoas que encomendavam serviço, criando problemas; entretanto, no caso, faria exceção e aquiesceu.
A breve trecho, seguíamos, junto dela, para Copacabana.
No endereço indicado, saltou, fez-se acompanhar pelo condutor ao apartamento da amiga, sendo recebida com a lhaneza que esperava. Segredou, envergonhada, para Dona Cora que se achava em apuros, se ela não dispunha, naquela hora, de algum dinheiro para emprestar. Pagaria no dia seguinte. A dona da casa, espontânea e bondosa, não titubeou... Abriu pequena gaveta e falou sorrindo: “só quatrocentos cruzeiros”. O marido não estava. Marita, reconhecida, explicou que a importância bastava. Depois da corrida paga, disse para a senhora que andara em serviço extra, fora em seguida ao Leblon visitar um doente, afetando que somente naquele instante conseguiria tomar o ônibus para casa. Antes disso, porém, tinha necessidade de um telefonema. Conversação com pessoa muito íntima. Dona Cora cedeu-lhe a peça inteira e acrescentou, gentil, que ia arranjar um cafezinho. Falasse à vontade, ninguém a interromperia. As duas filhinhas dormiam, há muito, e o esposo que substituía um colega, no trabalho, não regressaria tão cedo. A dona da casa afastou-se para a cozinha, isolando a sala.
E, ali, diante de nós, sem que nos percebesse, de leve, os corações solidários, Marita discou, sofreando a emoção de modo a fantasiar a alegria da outra.
Escutamos, transidos, o diálogo juvenil que nos ficaria, então, na memória, gravado frase a frase:
– Da residência dos Torres?
– Sim.
– Quem no aparelho? Gilberto?
– Sim, sim.
– Oh! meu bem, pois você não está conhecendo?
– Conhecendo quem?
– Eu, eu... Marina. Acabo de chegar...
– Ah! ah! Marina!... que surpresa boa!... por que essa demora?...
Estamos todos em casa, esperando... Telefonar por quê?
– Quis saber, meu amor, se você está bem, se passou bem o dia...
– Saudades!
– Eu também... Muita saudade...
– Venha.
– E a mamãe? Melhor?
– Pouquinho.
– Escute...
– Para que conversar? Corra para cá, venha logo...
– Um momentinho só... Escute. Passei rapidamente em casa, no Flamengo, para conversar com mãezinha certas coisas... Estive com duas amigas em Teresópolis que me encheram a cabeça...
Estou perturbada, ciumenta...
– Que é que há?
– Marita...
– Ora... Marita! Tenho nada com ela.
– Da residência dos Torres?
– Sim.
– Quem no aparelho? Gilberto?
– Sim, sim.
– Oh! meu bem, pois você não está conhecendo?
– Conhecendo quem?
– Eu, eu... Marina. Acabo de chegar...
– Ah! ah! Marina!... que surpresa boa!... por que essa demora?...
Estamos todos em casa, esperando... Telefonar por quê?
– Quis saber, meu amor, se você está bem, se passou bem o dia...
– Saudades!
– Eu também... Muita saudade...
– Venha.
– E a mamãe? Melhor?
– Pouquinho.
– Escute...
– Para que conversar? Corra para cá, venha logo...
– Um momentinho só... Escute. Passei rapidamente em casa, no Flamengo, para conversar com mãezinha certas coisas... Estive com duas amigas em Teresópolis que me encheram a cabeça...
Estou perturbada, ciumenta...
– Que é que há?
– Marita...
– Ora... Marita! Tenho nada com ela.
– Mas eu soube...
– Soube o quê?
– Que vocês dois estão em compromisso. Sei que vocês andavam juntos, mas tanto assim não sabia...
– Bobagem!
– É muita conversa que não pude desmentir...
– Perda de tempo. É muita gente biruta... Morou?7
– Estive com papai ainda agora...
Nesse ponto da conversação singular, a voz dela titubeou.
Ouvira o bastante para reconhecer-se desdenhada, batida. Entretanto, aspirava à lia do cálice. Necessário inteirar-se acerca de quanto Gilberto havia descido. Receava descobrir-se. Indispensável toda precaução, a fim de escalpelar o insulto de que fora vítima.
A pausa, no entanto, foi curta. Gilberto, no outro lado, pronunciou a deixa oportuna:
– Então...
– Explique-se.
– Bem, você naturalmente deve saber agora o que aconteceu.
O velho me procurou... Ele mesmo telefonou, sabe? Conversamos pessoalmente, acertamos tudo.
– Quer dizer que Marita...
– Imagine! escreveu-me pedindo encontro. O velho soube de tudo antes e me pediu dizer que iria, mas que eu não fosse. Entende?
– No fim de contas, como é que você se arranjou?
7 Expressão de gíria. “Morar” significando compreender.
– Soube o quê?
– Que vocês dois estão em compromisso. Sei que vocês andavam juntos, mas tanto assim não sabia...
– Bobagem!
– É muita conversa que não pude desmentir...
– Perda de tempo. É muita gente biruta... Morou?7
– Estive com papai ainda agora...
Nesse ponto da conversação singular, a voz dela titubeou.
Ouvira o bastante para reconhecer-se desdenhada, batida. Entretanto, aspirava à lia do cálice. Necessário inteirar-se acerca de quanto Gilberto havia descido. Receava descobrir-se. Indispensável toda precaução, a fim de escalpelar o insulto de que fora vítima.
A pausa, no entanto, foi curta. Gilberto, no outro lado, pronunciou a deixa oportuna:
– Então...
– Explique-se.
– Bem, você naturalmente deve saber agora o que aconteceu.
O velho me procurou... Ele mesmo telefonou, sabe? Conversamos pessoalmente, acertamos tudo.
– Quer dizer que Marita...
– Imagine! escreveu-me pedindo encontro. O velho soube de tudo antes e me pediu dizer que iria, mas que eu não fosse. Entende?
– No fim de contas, como é que você se arranjou?
7 Expressão de gíria. “Morar” significando compreender.
(Nota do Autor espiritual.)
CONTINUA AMANHÃ
Nenhum comentário:
Postar um comentário