domingo, 28 de outubro de 2012

SEXO E DESTINO LIVRO DE CHICO XAVIER

CONTINUAÇÃO

ma enfermidade séria que, ao arrojá-la no leito, lhe modificaria a mente, predispondo-a a diferentes impressões; entretanto, o corpo da jovem não se mostrava habilitado a receber esse gênero de amparo. Marita, sumamente desorientada e enfraquecida, desencarnaria no desajuste orgânico mais pronunciado que viesse a sofrer, em caráter providencial. Não surgia outra alternativa, senão a de esperar pela resistência moral dela própria.
Convidados a escoltá-la até a casa, Neves, Percília e eu colocamo-nos, de volta.
Marita não revelava aspecto algum para melhor, quanto àNcondição mental, mas o auxílio magnético surtira efeito imediato e salutar, porquanto, reajustada ao corpo denso, passou a repousar sem agitação, pelo que deixamo-la a dormir profundamente.
Despedimo-nos de Percília, ante o céu estrelado, e, de novo a sós, talvez porque me sentisse a indagação inarticulada, Neves confidenciou:
– André, você conhece essa senhora?
E, ao meu sinal negativo:
– Essa é a mesma que eu vi no cabaré, quando agredi meu genro, num gesto impensado; a desconhecida que me apoiou, no regresso ao aposento de Beatriz, apenas com a diferença de que
hoje não traz consigo o distintivo luminoso... Mas, não tenho dúvida alguma. É a mesma pessoa...

Capítulo 12
 
Neves e eu permutávamos conjeturas, quando alguém nos abraçou, de afetuosa maneira.
Era o irmão Félix, a despedir-se.
Espírito admirável pela abnegação e pela ciência, reverenciado por todos os seareiros do bem, onde passasse, em se referindo aos protagonistas do drama familiar que se nos oferecia à atenção, apresentava os olhos marejados de pranto.
Via-se-lhe, não somente a piedade fraterna, mas também o imenso amor àquelas quatro almas, reunidas ali, naquele aprazível recanto do Rio.
Parados, agora, respirando as aragens que encrespavam docemente as águas da Guanabara, enquanto o céu da madrugada imprimia mais amplo realce às estrelas, enternecia-nos reconhecer-lhe o paternal carinho, qual se fora um homem comum descansando conosco, à frente do mar.
Tão grande e tão puro o devotamento de que dava mostras, ao descerrar-nos os tesouros do coração, através das palavras, que o próprio Neves, irrequieto às vezes, ao escutar-lhe as apreciações, cumpria espontaneamente o que prometera. Nenhuma observação impulsiva, nenhuma interjeição impensada.
A atitude do instrutor, ao deter-se nas lutas escabrosas do plano físico, educava cativando. Elevação em cada frase, luz do sentimento em cada idéia.
Conquistava, sem pedir, o nosso interesse na prestação de assistência voluntária ao lar de Cláudio, cuja estabilidade periclitava, na conceituação dele mesmo.
Compadecia-se – elucidava, prestimoso – daquelas quatro criaturas, atiradas ao oceano da experiência terrestre, sem a bússola da fé. A princípio, esforçara-se por abrir-lhes um caminho
espiritual, mas debalde. Afundavam-se em profunda névoa de ilusão, hipnotizados pelas gratificações transitórias dos sentidos carnais, ao jeito de passarinhos agarrados à casca apodrecida de um fruto, sem a mínima disposição de consultar a saborosa riqueza da polpa.
Descobrindo algo mais à própria intimidade, relatou-nos que vira Cláudio renascer, que acompanhara Dona Márcia no berço, que seguira, de perto, a reencarnação de Marina e Marita, deixando ver nas reticências as lágrimas que semelhantes realizações lhe haviam custado, sem alardear virtude ou superioridade, em torno dos empeços vencidos.
Hipotecara dedicação, amizade, confiança e tempo, a fim de entrosá-los em alguma obra de benemerência, de maneira a cultivar-lhes a espiritualidade latente; no entanto, Cláudio e Márcia, de novo no estágio físico, sob o esquecimento inevitável e providencial do pretérito, haviam recapitulado certas experiências infelizes.
No mundo espiritual, antes de recomeçarem o trabalho terrestre, analisando as necessidades e os remorsos que lhes atenazavam as consciências, haviam prometido empregar o prêmio da internação no veículo carnal, edificando a sublimação íntima e corrigindo excessos de outras épocas, através do suor no serviço ao próximo; contudo, imperfeitamente chegados à juventude das forças corpóreas, tinham abraçado paixões que lhes frustravam todas as possibilidades de libertação próxima. Ele, Félix, e outros companheiros empenhavam-se em auxiliá-los, mas infrutiferamente. Os quatro resistiam a toda espécie de sugestão reparadora; repeliam, de pronto, qualquer projeto construtivo.
Nobres amigos de outras eras, aplicados a estender-lhes apoios preciosos, acabaram desiludidos, largando-os ao próprio arbítrio.

CONTINUA AMANHÃ

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