CONTINUAÇÃO
CAPÍTULO 43
ANTES DA REUNIÃO
Os preparativos espirituais para a reunião eram ativos e complexos.
Chegamos de regresso à residência de Dona Isabel, quando
faltavam poucos minutos para as dezoito horas e já o salão estava
repleto de trabalhadores em movimento.
Observando, com estranheza, determinadas operações, fiz algumas
perguntas ao nosso orientador, que me esclareceu com
bondade:
– Realizar uma sessão de trabalhos espirituais eficientes não é
coisa tão simples.
Quando encontramos companheiros encarnados,
entregues ao serviço com devotamento e bom ânimo, isentos
de preocupação, de experiências malsãs e inquietações injustificáveis,
mobilizamos grandes recursos a favor do êxito necessário.
Claro que não podemos auxiliar atividades infantis, nesse terreno.
Quem não deseje cuidar de semelhantes obrigações, com a seriedade
devida, poderá esperar fatalmente pelos espíritos menos
sérios, porquanto a morte física não significa renovação para
quem não procurou renovar-se.
Onde se reúnam almas levianas, ai
estará igualmente a leviandade.
No caso de Isabel, porém, há que
lhe auxiliar o esforço edificante.
Em todos os setores evolutivos, é
natural que o trabalhador sincero e eficiente receba recursos sempre
mais vastos.
Onde se encontre a atividade do bem, permanecerá
a colaboração espiritual de ordem superior.
Calara-se o bondoso amigo.
Continuei reparando as laboriosas atividades de alguns irmãos
que dividiam a sala, de modo singular, utilizando longas
faixas fluídicas.
Aniceto veio em socorro da minha perplexidade,
explicando, atencioso:
– Estes amigos estão promovendo a obra de preservação e vigilância.
Serão trazidas aos trabalhos de hoje algumas dezenas de
sofredores e torna-se imprescindível limitar-lhes a zona de influenciação
neste templo familiar.
Para isso, nossos companheiros
preparam as necessárias divisões magnéticas.
Observei, admirado, que eles magnetizavam o próprio ar.
Nosso instrutor, porém, informou, gentil:
– Não se impressione, André.
Em nossos serviços, o magnetismo
é força preponderante.
Somos compelidos a movimentá-lo
em grande escala.
E, sorrindo, concluiu:
– Já os sacerdotes do antigo Egito não ignoravam que, para
atingir determinados efeitos, é indispensável impregnar a atmosfera
de elementos espirituais, saturando-a de valores positivos da
nossa vontade.
Para disseminar as luzes evangélicas aos desencarnados,
são precisas providências variadas e complexas, sem o
que, tudo redundaria em aumento de perturbações. Este núcleo é
pequenino, considerado do ponto de vista material, mas apresenta
grande significação para nós outros.
É preciso vigiar, não o esqueçamos.
Enquanto as atividades de preparação espiritual seguiam intensas,
Dona Isabel e Joaninha, noutra ordem de serviço, chegaram
ao salão, dispondo arranjos diferentes.
Usaram, largamente, a
vassoura e o espanador. Revestiram a mesa de toalha muito alva e
trouxeram pequenos recipientes de água pura.
A uma ordem de um dos superiores daquele templo doméstico,
espalharam-se os vigilantes, em derredor da moradia singela.
Nos menores detalhes estava a nobre supervisão dos benfeitores.
Em tudo a ordem, o serviço e a simplicidade.
Logo após alguns minutos além das dezoito horas, começaram
a chegar os necessitados da esfera invisível ao homem comum.
Se fosse concedida à criatura vulgar uma vista de olhos, ainda
que ligeira, sobre uma assembléia de espíritos desencarnados, em
perturbação e sofrimento, muito se lhes modificariam as atitudes
na vida normal.
Nessa afirmativa, devemos incluir, igualmente, a
maioria dos próprios espiritistas, que freqüentam as reuniões
doutrinárias, alheios ao esforço auto-educativo, guardando da
espiritualidade uma vaga idéia, na preocupação de atender ao
egoísmo habitual.
O quadro de retificações individuais, após a
morte do corpo, é tão extenso e variado que não encontramos
palavras para definir a imensa surpresa.
Aqueles rostos esqueléticos causavam compaixão.
Chegavam
ao recinto aquelas entidades perturbadas, em pequenos magotes,
seguidas de orientadores fraternais.
Pareciam cadáveres erguidos
do leito de morte.
Alguns se locomoviam com grande dificuldade.
Tínhamos diante dos olhos uma autêntica reunião de “coxos e
estropiados”, segundo o símbolo evangélico.
– Em maioria – esclareceu Aniceto – são irmãos abatidos e
amargurados, que desejam a renovação sem saber como iniciar a
tarefa.
Aqui, poderemos observar apenas sofredores dessa natureza,
porque o santuário familiar de Isidoro e Isabel não está preparado
para receber entidades deliberadamente perversas.
Cada
agrupamento tem seus fins.
Com efeito, os recém chegados estampavam profunda angústia
na expressão fisionômica.
As senhoras em pranto eram numerosas.
O quadro consternava.
Algumas entidades mantinham as
mãos no ventre, calcando regiões feridas.
Não eram poucas as que
traziam ataduras e faixas.
– Muitos – disse-nos o mentor – não concordam ainda com as
realidades da morte corporal. E toda essa gente, de modo geral, está prisioneira da idéia de enfermidade.
Existem pessoas, e vocês,
como médicos, as terão conhecido largamente, que cultivam
as moléstias com verdadeira volúpia. Apaixonam-se pelos diagnósticos
exatos, acompanham no corpo, com indefinível ardor, a
manifestação dos indícios mórbidos, estudam a teoria da doença
de que são portadoras, como jamais analisam um dever justo no
quadro das obrigações diárias, e quando não dispõem das informações
nos livros, estimam a longa atenção dos médicos, os
minuciosos cuidados da enfermagem e as compridas dissertações
sobre a enfermidade de que se constituem voluntárias prisioneiras.
Sobrevindo a desencarnação, é muito difícil o acordo entre elas e
a verdade, porquanto prosseguem mantendo a idéia dominante.
Ás
vezes, no fundo, são boas almas, dedicadas aos parentes do sangue
e aproveitáveis na esfera restrita de entendimento a que se
recolhem, mas, no entanto, carregadas de viciação mental por
muitos séculos consecutivos.
E num gesto diferente, nosso instrutor considerou:
– Demoramo-nos todos a escapar da velha concha do individualismo.
A visão da universalidade custa preço alto e nem sempre
estamos dispostos a pagá-lo.
Não queremos renunciar ao gosto
antigo, fugimos aos sacrifícios louváveis.
Nessas circunstâncias, o
mundo que prevalece para a alma desencarnada, por longo tempo,
é o reino pessoal de nossas criações inferiores.
Ora, desse modo,
quem cultivou a enfermidade com adoração, submeteu-se-lhe ao
império.
É lógico que devemos, quando encarnados, prestar toda a
assistência ao corpo físico, que funciona, para nós, como vaso
sagrado, mas remediar a saúde e viciar a mente são duas atitudes
essencialmente antagônicas entre si.
A palestra era magnificamente educativa; entretanto, o número
crescente de entidades necessitadas chamava-nos à cooperação.
Muitas choravam baixinho, outras gemiam em voz mais alta.
Depois de longa pausa, Aniceto advertiu:
Vamos ao serviço.
Para nós, cooperadores espirituais, os
trabalhos já começaram.
A prece e o esforço dos companheiros
encarnados representarão o termo desta reunião de assistência e
iluminação em Jesus Cristo.
CONTINUA AMANHÃ
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