CONTINUAÇÃO
CAPÍTULO 42
EVANGELHO NO AMBIENTE RURAL
Apagados os comentários mais vivos, relativamente ao episódio
desagradável, o superior hierárquico daquela grande turma de
trabalhadores espirituais indagou do nosso orientador, com delicadeza:
– Nobre Aniceto, valendo-vos da oportunidade, poderíeis interpretar
para nós outros alguma das lições evangélicas, ainda
hoje?
Aniceto aquiesceu, pressuroso.
Notei que o interesse em torno do assunto era enorme.
Com grande surpresa, vi que os servidores da gleba traziam
ao estimado mentor um livro, que não tive dificuldades em identificar.
Era um exemplar do Evangelho, que Aniceto abriu firmemente,
como quem sabia onde estava a lição do momento.
Fixando a página escolhida, começou a meditar, enquanto sublimada
luz lhe aureolava a fronte.
Houve profundo silêncio.
Todos os colaboradores demonstravam grande interesse pela
palavra que se fazia.
Tudo era de aspecto imponente e calmo na
Natureza.
Um rebanho bovino acercara-se de nós, atraído por
forças magnéticas que não consegui compreender.
Alguns muares
humildes chegaram, igualmente, de longe.
E as aves tranqüilizaram-
se nas frondes fartas, sem um pio.
A única voz que toava,
leve e branda, era a do vento, sussurrando harmonia e frescura.
A
paisagem não podia ser mais bela, vestida em ouro líquido do
Poente.
Excetuada a rusticidade natural do quadro vivo, o ambiente
sugeria recordações fiéis dos verdes salões de “Nosso Lar”.
Aniceto, mergulhando o olhar no Sagrado Livro, leu em voz
alta os versículos 19, 20 e 21 do capítulo 8, da Epístola aos Romanos:
– Porque a ardente expectação da criatura espera a manifestação
dos filhos de Deus.
Porque a criação ficou sujeita à vaidade,
não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitou, na esperança
de que também a mesma criatura será libertada da servidão da
corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus.
Em seguida, refletiu alguns instantes e comentou, com evidente
inspiração:
– “Irmãos, recebamos a bênção do campo, louvando o Amor
e a Sabedoria de Nosso Pai!
“Exaltemos o Soberano Espírito de Vida, que sopra em nós a
força eterna da incessante renovação!
“Ponderemos a palavra do Apóstolo da Gentilidade, para extrair-lhe o conteúdo divino!...
Há milênios a Natureza espera a
compreensão dos homens.
Não se tem alimentado tão somente de
esperança, mas vive em ardente expectação, aguardando o entendimento
e o auxílio dos Espíritos encarnados na Terra, mais propriamente
considerados filhos de Deus.
Entretanto, as forças
naturais continuam sofrendo a opressão de todas as vaidades
humanas.
Isto, porém, ocorre, meus amigos, porque também o
Senhor tem esperança na libertação dos seres escravizados na
Crosta, para que se verifique igualmente a liberdade na glória do
homem.
Conheço-vos de perto os sacrifícios, abnegados trabalhadores
espirituais do solo terrestre!
Muitos de vós aqui permaneceis,
como em múltiplas regiões do planeta, ajudando a companheiros
encarnados, acorrentados às ilusões da ganância de ordem
material.
Quantas vezes, vosso auxílio é convertido em baixas
explorações no campo dos negócios terrestres? A maioria dos
cultivadores da terra tudo exige sem nada oferecer.
“Enquanto zelais, cuidadosamente, pela manutenção das bases
da vida, tendes visto a civilização funcionando qual vigorosa
máquina de triturar, convertendo-se os homens, nossos irmãos, em
pequenos Moloques de pão, carne e vinho, absolutamente mergulhados
na viciação dos sentimentos e nos excessos da alimentação,
despreocupados do imenso débito para com a Natureza amorável
e generosa.
Eles oprimem as criaturas inferiores, ferem as
forças benfeitoras da vida, são ingratos para com as fontes do
bem, atendem às indústrias ruralistas, mais pela vaidade e ambição
de ganhar, que lhes são próprias, que pelo espírito de amor e
utilidade, mas também não passam de infelizes servos das paixões
desvairadas.
Traçam programas de riqueza mentirosa, que lhes
constituem a ruína; escrevem tratados de política econômica, que
redundam em guerra destruidora; desenvolvem o comércio do
ganho indébito, colhendo as complicações internacionais que dão
curso à miséria; dominam os mais fracos e os exploram, acordando,
porém, mais tarde, entre os monstros do ódio!
“É para eles, nossos semelhantes encarnados na Crosta, que
devemos voltar igualmente os olhos, com espírito de tolerância e
fraternidade. Ajudemo-los ainda, agora e sempre! Não esqueçamos
que o Senhor está esperando pelo futuro deles!
Escutemos os
gemidos da criação, pedindo a luz do raciocínio humano, mas não
olvidemos, também, a lágrima desses escravos da corrupção, em
cujas fileiras permanecíamos até ontem, auxiliando-os a despertar
a consciência divina para a vida eterna!
Ainda que rodeiem o
campo de vaidades e insolências, auxiliemo-los ainda.
O Senhor
reserva acréscimos sublimes de valores evolutivos aos seres sacrificados.
Não olvidará Ele a árvore útil, o animal exterminado, o
ser humilde que se consumiu em benefício de outro ser!
Cooperemos,
por nossa vez, no despertar dos homens, nossos irmãos,
relativamente ao nosso débito para com a Natureza maternal.
Sempre, ao voltarmos à Crosta, envolvendo-nos em fluidos do
círculo carnal, levamos muito longe a aquisição de nitrogênio.
“Convertemos em tragédia mundial o que poderia constituir a
procura serena e edificante.
“Como sabemos, organismo algum poderá viver na Terra sem
essa substância e, embora se locomova, no oceano de nitrogênio,
respirando-o na média de mil litros por dia, não pode o homem,
como nenhum ser vivo do planeta, apropriar-se do nitrogênio do
ar.
Por enquanto, não permite o Senhor a criação de células nos
organismos viventes do nosso mundo, que procedam à absorção
espontânea desse elemento de importância primordial na manutenção
da vida, como acontece ao oxigênio comum.
Somente as
plantas, infatigáveis operárias do orbe, conseguem retirá-lo do
solo, fixando-o para o entretenimento da vida noutros seres.
Cada
grão de trigo é uma bênção nitrogenada para sustento das criaturas,
cada fruto da terra é uma bolsa de açúcar e albumina, repleta
do nitrogênio indispensável ao equilíbrio orgânico dos seres vivos.
“Todas as indústrias agropecuárias não representam, na essência,
senão a procura organizada e metódica do precioso elemento
da vida.
Se o homem conseguisse fixar dez gramas, aproximadamente,
dos mil litros de nitrogênio que respira diariamente,
a Crosta estaria transformada no paraíso verdadeiramente espiritual.
Mas, se muito nos dá o Senhor, é razoável que exija a colaboração
do nosso esforço na construção da nossa própria felicidade.
Mesmo em “Nosso Lar”, ainda estamos distantes da grande
conquista do alimento espontâneo pelas forças atmosféricas, em
caráter absoluto.
E o homem, meus amigos, transforma a procura
de nitrogênio em movimento de paixões desvairadas, ferindo e
sendo ferido, ofendendo e sendo ofendido, escravizando e tornando-se cativo, segregado em densas trevas!
Ajudemo-lo a compreender,
para que se organize uma era nova.
Auxiliemo-lo a amar a
terra, antes de explorá-la no sentido inferior, a valer-se da cooperação
dos animais, sem os recursos do extermínio!
Nessa época, o
matadouro será convertido em local de cooperação, onde o homem
atenderá aos seres inferiores e onde estes atenderão às necessidades
do homem, e as árvores úteis viverão em meio do
respeito que lhes é devido. Nesse tempo sublime, a indústria
glorificará o bem e, sentindo-nos o entendimento, a boa vontade e
a veneração às leis divinas, permitir-nos-á o Senhor, pelo menos
em parte, a solução do problema técnico de fixação do nitrogênio
da atmosfera.
Ensinemos aos nossos irmãos que a vida não é um
roubo incessante, em que a planta lesa o solo, o animal extermina
a planta e o homem assassina o animal, mas um movimento de
permuta divina, de cooperação generosa, que nunca perturbaremos
sem grave dano à própria condição de criaturas responsáveis
e evolutivas!
Não condenemos! Auxiliemos sempre!.
A assembléia, tanto quanto nós, estava sob forte impressão.
Aniceto calou-se, contemplou com simpatia os animais e as
aves próximas, como se estivesse a endereçar-lhes profundos
pensamentos de amor e, a seguir, fechou o Livro Sagrado, com
estas palavras:
– Observamos com o Evangelho que a criação aguarda ansiosamente
a manifestação dos filhos de Deus encarnados! Concordamos
que as criaturas inferiores têm suportado o peso de iniqüidades
imensas! Continuemos em auxilio delas, mas não nos percamos
em vãs contendas.
Os homens esperam também a nossa
manifestação espiritual!
Desse modo, ajudemos a todos, no capitulo
do grande entendimento.
CONTINUA AMANHÃ
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