sábado, 26 de maio de 2012

OS MENSAGEIROS - LIVRO DE CHICO XAVIER

CONTINUAÇÃO 

CAPÍTULO 36 
MÃE E FILHOS 

No comentário evangélico, eu recolhia observações interessantes. 
Tal como no caso de Ismália, quando lhe ouvíamos a sublime melodia, a interpretação de Fábio estava cheia de maravilhas espirituais que transcendiam à capacidade receptiva de Dona Isabel. 
A viúva de Isidoro parecia deter tão somente uma parte. Desse modo, as crianças recebiam a lição de acordo com as possibilidades mediúnicas da palavra materna, enquanto que a nós outros se propiciava o ensinamento com maravilhoso conteúdo de beleza. 
Sempre solícito, o instrutor esclareceu: – Não se admirem do fenômeno! cada qual receberá a luz espiritual conforme a própria capacidade. Há muitos companheiros nossos, aqui reunidos, que registram o comentário de Fábio com mais dificuldade que as próprias crianças. Experimentam, ainda, grandes limitações. Havia grande respeito em todos os desencarnados presentes. 
Fábio Aleto sentou-se em plano superior, ao passo que Isidoro se acomodava junto da esposa, no impulso afetivo do pai que se aproxima, solícito, para a conversação carinhosa com os filhos bem-amados. 
Nesse instante, a pequenina Marieta, que parecia haver atingido os sete anos, aproveitando o momento de palavra livre, perguntou à mãezinha, em tom comovedor: – Mamãe, se Jesus é tão bom, porque estamos comendo só uma vez por dia, aqui em casa? Na casa de Dona Fausta, eles fazem duas refeições, almoçam e jantam. 
Neli me contou que no  tempo de papai também fazíamos assim, mas agora... Porque será? 
A viúva esboçou um sorriso algo triste e falou: – Ora, Marieta, você vive muito impressionada com essa questão. Não devemos, filhinha, subordinar todos os pensamentos às necessidades do estômago. Há quanto tempo estamos tomando nossa refeição diária e gozando boa saúde? 
Quanto benefício estaremos colhendo com esta frugalidade de alimentação? Joaninha interveio, acrescentando: – Mamãe tem toda a razão. Tenho visto muita gente adoecer por abuso da mesa. – Além disso – acentuou Dona Isabel, confortada –, vocês devem estar certos de que Jesus abençoa o pão e a água de todas as criaturas que sabem agradecer as dádivas divinas. É verdade que Isidoro partiu antes de nós, mas nunca nos faltou o necessário. 
Temos nossa casinha, nossa união espiritual, nossos bons amigos. 
Convençam-se de que o papai está trabalhando ainda por nós. 
Nessa altura da palestra, dada a nossa comoção, Isidoro enxugou os olhos úmidos. 
Noemi, a caçula pequenina, falou em voz infantil: – É mesmo, é verdade! eu vi papai ajudando a segurar o bolo que Dona Cora nos trouxe domingo. – Também vi, Noemi – disse Dona Isabel, de olhos vivamente brilhantes –, papai continua auxiliando-nos. 
E voltando-se para todos, acentuou: – Quando sabemos amar e esperar, meus filhos, não nos separamos dos entes queridos que morrem para a vida física. Tenhamos certeza na proteção de Jesus!... Marieta, parecendo agora absolutamente tranqüila, assentiu: 
Quando a senhora fala, mamãe, eu sinto que tudo é verdade! Como Jesus é bom! E se nós não tivéssemos a senhora? 
Tenho visto os pequenos mendigos abandonados. 
Talvez não comam coisa alguma, talvez não tenham amigos como os nossos! Ah! como devemos ser agradecidos ao Céu!... 
A viúva, que se confortava visivelmente, ouvindo aquelas palavras, exclamou com profunda emoção: – Muito bem, minha filha! Nunca deveremos reclamar e sim louvar sempre. E possivelmente não saberia você compreender a situação, se estivéssemos em mesas lautas. 
Observei, porém, que o menino não compartilhava aquele dilúvio de bênçãos. 
Entre Dona Isabel e as quatro filhinhas havia permuta constante de vibrações luminosas, como se estivessem identificadas no mesmo ideal e unidas numa só posição; mas o rapazote permanecia espiritualmente distante, fechado num círculo de sombras. 
De quando em quando, sorria irônico, insensível à significação do momento. 
Valendo-se da pausa mais longa, ele perguntou à genitora, menos respeitosamente: – Mamãe, que entende a senhora por pobreza? 
Dona Isabel respondeu, muito serena: – Creio, meu filho, que a pobreza é uma das melhores oportunidades de elevação, ao nosso alcance. 
Estou convencida de que os homens afortunados têm uma grande tarefa a cumprir, na Terra, mas admito que os pobres, além da missão que lhes cabe no mundo, são mais livres e mais felizes. 
Na pobreza, é mais fácil encontrar a amizade sincera, a visão da assistência de Deus, os tesouros da natureza, a riqueza das alegrias simples e puras. 
É claro que não me refiro aos ociosos e ingratos dos caminhos terrenos. 
Refiro-me aos pobres que trabalham e guardam a fé. 
O homem de grandes possibilidades financeiras muito dificilmente saberá discernir entre a afeição e o interesse mesquinho; crente de que tudo pode, nem sempre consegue entender a divina proteção; pelo conforto viciado a que se entrega, as mais das vezes se afasta das bênçãos da Natureza; e em vista de muito satisfazer aos próprios caprichos, restringe a capacidade de alegrar-se e confiar no mundo. Apesar da beleza profunda daquela opinião, o rapazola permaneceu impassível, respondendo algo contrariado: – Infelizmente, não posso concordar com a senhora.
Até os garotos do jardim de infância pensam de modo contrário. Dona Isabel mudou a expressão fisionômica, assumiu a atitude de quem instrui com a noção de responsabilidade, e acentuou: – Não estamos aqui num jardim de infância, meu filho. 
Estamos no jardim do lar, competindo-nos saber que as flores são sempre belas, mas que a vida não pode prosseguir sem a bênção dos frutos. Por onde andarmos no mundo, receberemos muitos alvitres da mentira venenosa. 
É preciso vigiar o coração, Joãozinho, valorizando as bênçãos que Jesus nos envia. 
O rapazinho, entretanto, demonstrando enorme rebeldia íntima, tornou: – A senhora não considera razoável alugar este salão a fim de termos algum dinheiro a mais? 
Estive conversando, ontem, com o “seu” Maciel, quando vim da escola. 
Ele nos pagaria bem, para ter aqui um depósito de móveis. Dona Isabel, de ânimo decidido, respondeu com energia, sem irritação: – Você deve saber, meu filho, que enquanto respeitarmos a memória de seu pai, este salão será consagrado às nossas atividades evangélicas. 
Já lhes contei a história do nosso culto doméstico e não desejo que vocês sejam cegos às bênçãos do Cristo. 
Mais tarde, Joãozinho, quando você entrar diretamente na luta material, se for agradável ao seu temperamento, construa casas para alugar;  
Os  mas agora, meu filho, é indispensável que você considere este recanto como algo de sagrado para sua mamãe. – E se eu insistir? – perguntou, mal humorado, o pequeno orgulhoso. 
A viúva, muito calma, esclareceu firme: – Se você insistir, será punido, porque eu não sou mãe para criar ilusões perigosas ao coração dos filhinhos que Deus me confiou. 
Se muito amo a vocês, precisarei incliná-los ao caminho reto. 
O pequeno quis retrucar, mas a luz emitida pelo tórax de Dona Isabel, ao que me pareceu, confundiu-lhe o espírito rebelde e vi-o calar-se, a contragosto, amuado e enraivecido. 
Admirei, então, profundamente, aquela bondosa mulher, que se dirigia à filha mais velha como amiga, às filhinhas mais novas como mãe, e ao filho orgulhoso como instrutora sensata e ponderada. Aniceto, que também se mostrava satisfeito, disse-nos em tom significativo: – O Evangelho dá equilíbrio ao coração. 
A pequena Neli, amedrontada, pediu, humilde: – Mamãe, não deixe Joãozinho alugar a sala! 
A viúva sorriu, acariciou o rostinho da filha e asseverou: – Joãozinho não fará isso, saberá compreender a mamãe. 
Não falemos mais neste assunto, Neli. 
E fixando o relógio, dirigiu-se à primogênita: – Joaninha, minha filha, ore agradecendo, em nosso nome. Nosso horário está findo. 
A jovem, com expressão nobre e carinhosa, agradeceu ao Senhor, tocando-nos os corações. 

CONTINUA AMANHÃ

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