quinta-feira, 3 de maio de 2012

OS MENSAGEIROS - LIVRO DE CHICO XAVIER - CAPÍTULO 13

CONTINUAÇÃO

13 - PONDERAÇÕES DE VICENTE

Não estava farto de lições, mas, para o momento, havia aprendido bastante. Impressionado com o que me fora dado observar, não insisti com Vicente para prolongar nossa demora no Centro de Mensageiros.
 Deixando grandes grupos em conversação ativa, reconstituindo projetos e refazendo esperanças, segui o companheiro que me convidava a visitar os imensos jardins. Roseirais enormes balsamizavam a atmosfera leve e límpida. 
– Sinto-me fortemente impressionado – murmurei 
–. Quem diria pudessem caber tantas responsabilidades a essas criaturas?
 Não conheci pessoalmente nenhum médium ou doutrinador do Espiritismo, justificando agora minha surpresa.
 Vicente sorriu e ponderou: 
– Você, meu caro, procede das Câmaras de Retificação, onde os trabalhos são muito reservados e circunscritos.
 Talvez sua impressão provenha dessa circunstância.
 Verá, porém, com o tempo, que existem aqui locais de conversações dessa natureza, referentes a todas as oportunidades perdidas.
 Já visitou alguma dependência do Ministério do Esclarecimento? 
– Não. 
– Localizam-se, ali, os enormes pavilhões das escolas maternais. São milhares de irmãs que comentam, por lá, as desventuras da maternidade fracassada, buscando reconstituir energias e caminhos.
 Ainda ali, temos os Centros de Preparação à Paternidade.
 Grandes massas de irmãos examinam o quadro de tarefas perdidas e recordam, com lágrimas, o passado de indiferença ao dever.
 Nesse mesmo Ministério, temos a Especialização Médica. Nobres profissionais da Medicina, que perderam santas oportunidades de elevação, lá discutem seus problemas.
 Nesse instante o interrompi, observando: – Entretanto, somos médicos e não nos achamos lá. 
– Sim – explicou Vicente, bondoso –, infelizmente para nós ambos, caímos em toda a linha.
 Não só na qualidade de médicos, mas muito mais como homens, pois que, se disse a você o que sofri, ainda não contei o que fiz. 
– É verdade – concordei, desapontado, recordando minha condição de suicida inconsciente. 
– Ainda no Esclarecimento – prosseguiu o companheiro –, temos o Instituto de Administradores, onde os Espíritos cultos procuram restaurar as forças próprias e corrigir os erros cometidos na mordomia terrestre.
 Nos Campos de Trabalho, do Ministério da Regeneração, existem milhares de trabalhadores que se renovam para a recapitulação das grandes tarefas da obediência. 
– Somos numerosos – continuou, sorridente – os falidos nas missões terrestres e note-se que todos os que hajam chegado a zonas como “Nosso Lar” devem ser levados à conta dos extremamente felizes.
 Temos aqui dois Ministérios Celestiais, como o da Elevação e o da União Divina, cuja influenciação santificante eleva o padrão dos nossos pensamentos sem que o percebamos de maneira direta.
 O estágio aqui, André, representa uma bênção do Senhor e, por muito que trabalhássemos, nunca retribuiríamos a esta colônia na medida de nosso débito para com ela.
 Nossa situação é a de abrigados em verdadeiro paraíso, pelo ensejo de serviço edificante que se nos oferece.
 Quanto a outros companheiros nossos... Fez longo hiato e continuou: 
– Quanto a muitos, estão fazendo angustiosas estações de aprendizado nas regiões mais baixas.
 São infelizes prisioneiros uns dos outros, pela cadeia de remorsos e malignas recordações.
 No que concerne à Medicina, os colegas em bancarrota espiritual são inúmeros.
 A saúde humana é patrimônio divino e o médico é sacerdote dela.
 Os que recebem o titulo profissional, em nosso quadro de realizações, sem dele se utilizarem a bem dos semelhantes, pagam caro a indiferença.
 Os que dele abusam são, por sua vez, situados no campo do crime. Jesus não foi somente o Mestre, foi Médico também.
 Deixou no mundo o padrão da cura para o Reino de Deus.
 Ele proporcionava socorro ao corpo e ministrava fé à alma.
 Nós, porém, meu caro André, em muitos casos terrestres, nem sempre aliviamos o corpo e quase sempre matamos a fé.
 As palavras sensatas do amigo caiam-me n’alma como raios de luz.
 Tudo era a verdade, simples e bela. Ainda não pensara, de fato, em toda a grandeza do serviço divino de Jesus Médico.
 Ele expulsara febres malignas, curara leprosos e cegos de nascença, levantara paralíticos, mas nunca ficava apenas nisto.
 Reanimava os doentes, dava-lhes esperanças novas, convidava-os à compreensão da Vida Eterna.
 Engolfara-me em pensamentos grandiosos, quando o companheiro voltou a falar:
 – Tenho um amigo, nosso colega de profissão, que se encontra nas zonas inferiores, há alguns anos, atormentado por dois inimigos cruéis.
 Acontece que ele muito faliu como homem e médico.
 Era cirurgião exímio, mas, tão logo alcançou renome e respeito geral, impressionou-se com as aquisições monetárias e caiu desastradamente.
 Nos dias de grandes negócios financeiros, deslocava a mente das obrigações veneráveis, colocando-a distante, na esfera dos banqueiros comuns.
 Não fosse a proteção espiritual, essa atitude teria comprometido oportunidades vitais de muita gente.
 A colaboração do pobre amigo tornara-se quase nula, e alguns desencarnados nas intervenções cirúrgicas que ele praticava, notando-lhe a irresponsabilidade, atribuíram-lhe a causa da morte física, quando não a esperavam, votando-lhe ódio terrível. 
 Amigos do operador prestaram esclarecimentos justos a muitos; entretanto, dois deles, mais ignorantes e maldosos, perseveraram na estranha atitude e o esperaram no limiar do sepulcro.
 – Horrível! – exclamei.
 Se ele, porém, não é culpado da desencarnação desses adversários gratuitos, como pode ser atormentado desse modo? Explicou Vicente, em tom mais grave:
 – Realmente, não tem a culpa da morte deles. Nada fez para interromper-lhes a existência física.
 Mas é responsável pela inimizade e incompreensão criadas na mente dessas pobres criaturas, porque, não estando seguro do seu dever, nem tranqüilo com a consciência, o nosso amigo julga-se culpado, em razão das outras falhas a que se entregou imprevidentemente.
 Todo erro traz fraqueza e, assim sendo, o nosso colega, por enquanto, não adquiriu forças para se desvencilhar dos algozes.
 Perante a Justiça Divina, portanto, ele não resgata crimes inexistentes, mas repara certas faltas graves e aprende a conhecer-se a si mesmo, a entender as obrigações nobres e praticá-las, compreendendo, por fim, a felicidade dos que sabem ser úteis com segurança de fé em Deus e em si mesmos.
 A noção do dever bem cumprido, André, ainda que todos os homens permaneçam contra nós, é uma luz firme para o dia e abençoado travesseiro para a noite. 
 O nosso colega, tendo abusado da profissão, entrou em dolorosa prova. – 
Ah! sim – exclamei –, agora compreendo.
 Onde exista uma falta, pode haver muitas perturbações; onde apagamos a luz, podemos cair em qualquer precipício. – Justamente.
 Calou-se o amigo, andando, muito tempo, ao meu lado, como se estivesse surpreendido, como eu, defrontando as avenidas de rosas. 
Depois de longas meditações, convidou-me fraternalmente: – Regressemos ao nosso núcleo. 
Creio devamos ouvir Aniceto, ainda hoje, referentemente ao serviço comum. 

CONTINUA AMANHÃ

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