quarta-feira, 30 de novembro de 2011

VIDA ALÉM DA VIDA - LIVRO DE CHICO XAVIER - 2ª PARTE

CONTINUAÇÃO

O ACIDENTE

Na manhã de 12 de julho de 1985, quando completava 27 anos de idade, o engenheiro Lineu de Paula Leão Junior que na véspera havia dirigido sua camioneta por 860 quilômetros, viajando de Ituverava (SP) a Campo Grande (MS), dirigia-se para o centro comercial desta última cidade, através de sua avenida principal (com duas vias de tráfego e largo canteiro central) quando, em um dos seus principais cruzamentos, com o carro parado, aguardando o sinal verde, acabou sendo abalroado pela trazeira por um velho caminhão FNM. Este, desde que havia entrado na avenida, estava sem o funcionamento do cardã (a cruzeta não foi achada), o que demonstra o precário estado de sua conservação. Sem também a corrente obrigatória que seguraria o eixo do carda, esta peça começou a bater no asfalto e a ricochetear, de tal modo que inutilizou os canos dos freios e deu início às primeiras fagulhas de incêndio.
Utilizando uma via de tráfego proibida a caminhões, só o veterano motorista deve saber porque preferiu descer o acentuado declive da avenida, tendo certeza (tal o “rush” do momento) que o enorme caminhão vazio que dirigia só poderia parar utilizando como amortecedor um carro pequeno. O lógico seria guiar o veículo para o canteiro central, onde as árvores o parariam, sem perigo para ninguém.
Três quarteirões abaixo, realmente, motivou um dos maiores acidentes de trânsito da capital do Mato Grosso do Sul, com 10 veículos envolvidos. Apenas Junior morreu. Carbonizado, segundo o atestado de óbito.
A dor instalou-se na família enlutada e em muitos corações o desespero e o sofrimento fizeram seus ninhos.


A FAMÍLIA

Junior, solteiro, era filho de Lineu de Paula Leão e Elza Telles Faleiros Leão. Ambos aposentados: ele, como ex-Deputado à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo; ela, como professora do magistério oficial daquele Estado. Dedicam-se atualmente à agropecuária em propriedades agrícolas localizadas nos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.
Em janeiro de 1985 mudaram seu domicílio da capital de São Paulo para Campo Grande, por ser esta cidade, geograficamente, ponto central em relação às suas atividades. E, também, porque em Campo Grande, pelo mesmo motivo, já residia a filha, Sandra Maria, casada com o Dr. Saturníno Fernandes, possuidores de um casal de filhos, de 6 e 3 anos.
O pai Lineu, foi criado em lar tradicional espírita, eis que seus progenitores, Aristides de Paula Leão e Alayde de Paula Silveira, praticavam, enquanto vivos, o kardecismo, sendo que Aristides, por mais de três decênios foi presidente do Centro Espírita “Fé, Esperança e Caridade”, de Ituverava (SP). Lineu, como a maioria dos homens, distanciou-se de sua religião, na ânsia da conquista de bens materiais. Jamais tentou passar aos filhos, Junior e Sandra, sua crença.
A mãe, Elza, formou-se professora em escola de freiras e praticava o catolicismo, ainda que concordasse com temas básicos da teoria espírita, mormente o da reencarnação.
Seus filhos, com liberdade de optarem pela religião que quisessem, frequentaram o curso ginasial em educandários católicos.


O ACIDENTADO

Lineu de Paula Leão Junior nasceu em Ituverava (SP), em 12 de julho de 1958. cursou o ginasial no Arquidiocesano e o colegial no Objetivo, ambos em São Paulo. Formou-se engenheiro civil em Belo Horizonte.
Há um ano antes do acidente, praticava com sucesso a sojicultura e a pecuária em imóveis seus e ajudava seu pai na administração das propriedades deste.
Em carta de 15 de outubro de 1985, dirigida à Câmara Municipal de Ituverava (SP), em agradecimento a homenagem que a mesma prestara à memória de Junior, seus pais lhe traçaram o perfil.
“Modesto e humilde a mais não poder, jovial, honesto e sincero, simbolizava sempre a alma reta, do povo ituveravense, ao qual, sempre proclamava, com alto e bom som, tinha a satisfação de pertencer. Filho boníssimo e carinhoso, tinha sempre nos lábios o sorriso franco e uma palavra de amizade aos que dele se acercavam.”
Dentre seus livros, seus pais encontraram inúmeras obras espíritas, dentro as quais “O Evangelho Segundo o Espiritismo” de Allan Kardec. Souberam ainda que Junior, quando em Ituverava, frequentava, em companhia de sua namorada, o Centro Espírita do qual seu avô Aristides fora presidente.


APÓS O ACIDENTE

Como uma mortalha, o sofrimento cobriu todos os sentimentos dos pais de Junior, tão inesperada e violenta foi sua morte, que o colheu no esplendor da vida, quando começava a colher o fruto de seus estudos e de seu trabalho.
O sofrimento, nas personalidades bem formadas, faz com que o amor se sobreponha à revolta e nos conduz ou nos retorna a Deus. E quando retornamos aos estreitos caminhos que nos conduz ao Ser Supremo, observamos, com Leon Denis, que “a tristeza, o sofrimento, fazem-nos ver, ouvir, sentir mil coisas, delicadas ou fortes, que o homem feliz ou o homem vulgar não pode perceber”.
Mostra-nos o sofrimento pela perda de um ente querido, que as conclusões para psicológicas apenas estão confirmando os princípios da Ciência Espírita. Assim, as faculdades paranormais ou psi; a natureza extra física da mente e do pensamento; os fenômenos tétaagêneres, a mecânica quântica da consciência, a psigama ou psicapa (mediunidade inteligente e de efeitos físicos) e outros, vêm sendo proclamados pelo espiritismo desde sua codificação.
O sofrimento e o desespero não conduziram os pais de Junior à revolta e à vingança. Fizeram-nos, sm retornar, humildes, à religião. E levaram-nos a Chico Xavier.


FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

A humildade, a brandura, a honestidade transparente, a alegria na dor, a resignação no sofrimento do grande médium levaram às suas almas os primeiros lenitivos. Suas mentes começaram a sair do tumulto em que se encontravam.
A simples presença de Francisco Xavier tranqüiliza; ela como que harmoniza as mentes presentes em pensamentos de fraternidade e amor; expulsa do ambiente, como em passe de mágica, os pensamentos mesquinhos ou falsos.
Pobres ou ricos; cultos ou analfabetos; pretos ou brancos,; poderosos ou humildes, todos, diante da presença física daquele homem, sentem-se iguais como iguais devem ser todos os filhos de Deus.
Ao ouvir suas palestras e suas respostas aos múltiplos problemas que lhe são expostos, mais o admiramos, tal a tranquilidade que advém de suas palavras.
Os ambientes humildes de sua residência e de sua casa de preces recendem paz e transmitem serenidade.
Que é um homem bom, simples e modesto, tudo o indica. Mas deve ser também um homem culto, ainda que sem ostentar láureas e acadêmicas. Senão, como dissecar tantos e complexos temas com a habilidade do mais exímio cirurgião? Senão, como comentar conceitos de “ A Grande Síntese”, de Pietro Ubaldi, à frente de seu autor, com nos conta o Prof. Clóvis Tavares em seu livro “Trinta Anos com Chico Xavier”?


UM DIA ANTES DA PRIMEIRA MENSAGEM

Os pais de Junior sabiam que suas preces poderiam ser efetuadas em qualquer ambiente. Contudo, as ondas de fogo que consumiram o corpo físico do filho querido, comumente brotavam em seus corações, incendiavam suas mentes e turvavam suas vistas. Por mais que corressem em suas faces, silenciosas e tristes, eram poucas suas lágrimas para abrandarem o fogo do sofrimento e da saudade.
A paz que emana de Chico Xavier e dos ambientes em que ele se encontra, todavia, fazia com que as preces que pronunciavam em sua casa ou em seu centro, como que os aproximavam mais de Deus e do filho que partira tão cedo.
Na sexta visita ao “Grupo Espírita da Prece”, de Chico Xavier, dia 1.11.85, os pais de Junior observaram que uma senhora da mesa diretora dos trabalhos os observava constantemente.
Posteriormente, esta senhora dirigiu-se à Da. Elza, perguntando-lhe:
“ — Seu filho desencarnou recentemente?”
Diante da resposta afirmativa, continuou:
“— Ele parecia consigo. Apenas o rosto era mais fino e comprido. Sorriso largo, com os bonitos dentes superiores se mostrando todos, à frente, não?”
Surpresa, novamente Elza confirmou os dizeres da interlocutora e mostrou-lhe um retrato recente do filho, no qual, por defeito fotográfico, Junior estava mais moreno que na realidade era.
“— Este mesmo. Mas bem mais claro.”, disse a senhora.
Os pais de Junior se admiraram e perguntaram-lhe se havia conhecido seu filho e onde ela o havia visto.
“— Não o conheci quando em vida. Mas, durante os trabalhos desta noite, não pude deixar de observar aquele rapaz ao lado de vocês, sorrindo. E, quando a senhora chorava, lágrimas também desciam dos olhos dele.”
Citada senhora, Da. Guiomar Albaneze, diretora do “Centro Espírita Perseverança”, de São Paulo, e de outras obras sociais daquela Capital, com seus dizeres, animou os pais do falecido, pois se ela, médium vidente, observara Junior ao lado deles seria porque ele estaria próximo a lhes transmitir algo.
Realmente, na madrugada do dia seguinte 2.11.85, pela mediunidade assombrosa de Chico Xavier, Junior transmitiu a seus pais sua primeira mensagem, 3 meses e 20 dias após sua morte.


PRIMEIRA MENSAGEM

Querida mãezinha Elza
E querido papai Lineu:

Agradeço-lhes a presença confortadora e tentarei alinhar algumas notícias minhas.
Naquele dia 12 as horas amanheceram com a fisionomia de festa.
Notava a mãezinha Elza preocupada com a mesa que nos oferecia naquela marca dos vinte e sete anos. ( 1 ).
Não sei se estou enfileirando dados exatos, porque estou em convalescença e recuperação.
Quero dizer-lhes porém, que em mim tudo respirava vigor e tranquilidade, sempre escudado na dedicação dos pais queridos.
Dispus-me a sair pela manhã de sol alto, (2) certamente o papai Lineu viria a fazenda ao nosso encontro. (3) Pensei que deveria necessitar de algum dinheiro, trocando alguns de meus cheques com amigos nossos.
As horas seguiam na matemática dos ponteiros.
Parei o carro na retaguarda de outros vários que aguardavam o sinal, quando senti que um corpo pesado em demasia prensava o meu Alfa, ao mesmo tempo que aquele impacto me atingia a cabeça com violência.
Entontecido, de repente observei que algo de estranho me espancava a vida intracraniana e compreendi que fora vítima da ruptura de vasos importantes, sem que fosse permitido falar.
Aquela estranha convulsão me apagara o raciocínio. Tentei recorrer à oração; entretanto, a coordenação de meus vocábulos, mesmo no pensamento, se fazia impossível.
Como se fora transportado da inconsciência ao sono, vi a mim próprio fora do meu corpo, espantando-me com a dualidade de que o choque me fazia objeto.
Naquela atmosfera de penumbra, embora soubesse que o sol claro estaria brilhando por fora de minha sonolência, avistei um homem de olhar compassivo que me estendeu as mãos, esclarecendo:
“— Lineuzinho, venha conosco; seu avô Aristides também está a sua espera!”
Tudo aquilo transcorria numa partícula mínima de tempo, quando ouvi barulho de explosão à retaguarda.
“— Filho, sigamos! – falou o amigo generoso – Não olhe para trás, porque de agora em diante, os seus caminhos se desdobram para a frente!”
Nesse mesmo instante, vi que vovô Aristides finalmente chegava e os dois entrelaçaram as mãos para que eu pudesse dispor de um abrigo para descanso (4).
Procurei ainda exercitar a palavra a fim de avisar que me achava à espera de meu pai Lineu, quando um torpor irresistível me submeteu a um sono agitado, que até hoje não consigo compreender.
Aquele sono era um labirinto de pesadelos, no qual observava estampados quadros vivos de minha própria existência.
Quis relutar contra o repouso, de modo a definir o que me ocorria; entretanto, o sono se fez mais profundo e perdi de todo a noção de mim.
Despertei num ambiente agradável, em que os dois amigos pareciam aguardar-me a conscientização.
Meu avô, embora entendendo as minha dificuldades da voz, apresentou-me o companheiro da primeira hora:
“— Lineuzinho, este é o nosso Aristides Nery, de Igarapava. Ambos temos o mesmo nome”. (5)
Fiz um aceno, movimentando levemente a cabeça dolorida, na intenção de demonstrar a minha simpatia para com o desconhecido.
Nesse ponto de minhas lembranças, entrou uma senhora que se me deu a conhecer por mãe da vovó Joana e que até hoje me dispensa especial carinho. (6)
Demorei um tanto a retomar a minha capacidade vocal e perguntei a meu avô se tudo aquilo que estava acontecendo era a morte. Ele confirmou, trocando a expressão “morte” por “desencarnação”.
Reconhecendo-me transferido à força para a vida diferente que, de certo, me aguardava para novas obrigações, passei a chorar, recordando os pais queridos, a nossa Sandra Maria e a nossa Luciana, que não acreditariam naquela mudança compulsória. (7 – 11).
Recordei Ituverava, os amigos da fazenda, além dos meus laços mais íntimos e desatei o pranto que me banhou todo o rosto. (8)
Meu avô compadeceu-se de mim e falou-me palavras de consolo e esperança, que me ficariam impressas na memória.
Depois de alguns dias pude rever a família em Campo Grande e começava a pensar em suicídio, quando o vovô Aristides se incumbiu de erradicar de mim tais pensamentos, explicando com bom humor que eu já não conseguiria destruir o meu corpo de novas expressões e, usando o melhor de mim, de que poderia dispor, deliberei aceitar a situação com a possível serenidade. Com isso, tranquilizei os amigos que me cercavam e pude retornar a Campo Grande, amargurando-me com a tristeza da mamãe Elza, que não conseguia me esquecer.
Foi então que ao ler-lhe os pensamentos, como quem senhoreia textos de páginas e páginas, vim , a saber, que Instituto Médico Legal me considerava vítima de queimaduras que a nenhum corpo humano é dado resistir.(9)
Com todo o meu respeito ao I.M.L., desejei aclarar a idéia de minha mãe sobre a intensa hemorragia interna que me expulsou do corpo.
Hoje venho confirmar isso, para arredar da cabeça da mãezinha e do pensamento de nossa Sandra Maria, a suposta informação de que eu teria sido vítima de queimaduras cruéis. (10)
Isso não aconteceu. Não me lembrei de queimadura alguma, de vez que não retratara nenhuma.
Se o fogo desmantelou o meu carro, não me alcançou de modo algum.
Mãe peço-lhe coragem e fé em Deus.
As queimaduras mencionadas nas perícias, tanto me tocaram como as chamas atingem a roupa de alguém sem ferir esse alguém.
Peço à mãezinha Elza diga minhas notícias à nossa Sandra e à nossa Luciana, a companheirinha, que eu tomaria, em breve, se Deus permitisse, para a condição de minha esposa e tutora espiritual, no casamento que nos reuniria as esperanças. (11)
Agora, peço aos queridos pais serenidade e bom ânimo, com a certeza de que continuo em vida diferente mas ligado à nossa existência comum.
Rogo ao papai Lineu conformação e paz em nosso favor, porque há muito que fazer para ele, unido a mim.
Nós ambos trabalharemos, quanto possível, para que o bem se estenda aos outros, porque na verdade sou seu filho mas junto de outros rapazes, filhos de Deus quanto nós, que esperam quem lhes estimule o propósito de trabalhar e estudar. (12)
Papai, a nossa vida não terminou e os nossos planos de agir para a execução do bem comum continuam comigo.
Mãezinha Elza, abençoe-me e fique tranquila. As saudades são de nossa plantação recíproca.
Lembremo-nos de que a nossa Sandra e nosso amigo Fernandes, com a familhinha iniciante, precisam de nós e tenhamos paz e coragem para a travessia das renovações do momento. (13)
Muito carinho à nossa Luciana e muitas lembranças aos nossos de Campo Grande, da Fazenda e de Ituverava.
O meu avô Aristides e de parecer que já transmiti as notícias que se faziam convenientes e que devo terminar.
É o que faço saudosamente, beijando-lhes reconhecidamente as mãos de pais queridos, lutadores fiéis e obreiros do bem, com o imensurável amor e o maior respeito do filho que lhes deve as maiores alegrias e pede a Deus conservá-los sempre e cada vez mais felizes.
Lineu de Paula Leão Junior (14)
2 de novembro de 1985

CONTINUA AMANHÃ

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