domingo, 20 de novembro de 2011

ESTAMOS VIVOS - LIVRO DE CHICO XAVIER - PARTE 19

CONTINUAÇÃO

VALÉRIA CONSENTINO

“Pai, confio em sua maturidade e em sua abençoada vida”

Meu querido pai, que a Providência Divina nos abençoe.
Sou a Valéria que vem conversar consigo.
Minhas dificuldades foram muito grandes, logo após o acidente na Marginal.
Seguia despreocupada com a melhor atenção no trânsito, quando a máquina mais pesada me abalroou e o carro não conseguiu suportar aquele toque indesejável.
O meu choque foi indescritível, porque ninguém conta com as possibilidades de um desastre ao sair de casa.
Vi-me, de momento para outro, atirada de encontro àquelas peças frias que, em me amassando todo o corpo, ao que percebi, me abriam fontes de sangue nas hemorragias internas.
Compreendi que o inevitável acontecera e que me achava desvalida de recursos para evitar a tragédia.
Embora aflita e atormentada com a perspectiva da morte, num pequeno espaço mental que me restava à lucidez, formulei uma prece, rogando o socorro de Deus.
Populares se abeiravam do quadro que não desejo guardar na lembrança, mas não me recordo de um só rosto que me fosse conhecido.
Meus olhos estavam pesados e por mais me esforçasse, não conseguia cerrar as pálpebras.
Nesse instante, em que minhas esperanças já se achavam longe de mim, um torpor que não sei descrever me dominou as forcas que me restavam e desmaiei, até hoje não sei se de sofrimento ou de horror, porque as idéias contraditórias me esfogueavam a cabeça.
Não poderia resistir à convulsão que de mim se apossara, porque todos os meus últimos pensamentos se voltavam para a sua bondade paternal, para a Mãezinha Arlete e para o nosso Paulo, sem que eu pudesse algo fazer para tranqüilizá-los.
Caí numa inconsciência pesada e somente acordei, ignorando até hoje, depois de quantas horas ou de quantos dias, num aposento arejado e reconfortante que me firmou a suposição de estarem alguma internação de emergência, na Terra mesmo...
Meu cérebro estava confuso, sem que eu pudesse mentalizar os pensamentos com acerto, quando duas senhoras vieram para junto de mim, tentando sossegar-me o espírito atribulado.
– Não tenha medo! – recomendou uma delas – sou a sua avó Catarina e estamos reconfortadas por vê-la conosco.
A outra acrescentou:
– Valéria, não se creia abandonada. Estamos juntas. Sou a sua tia Zunckeller, chame-me assim e teremos muito contentamento em lhe sermos úteis.
Pude reerguer o meu ânimo abatido e agradeci com acenos de cabeça, porque a minha garganta me pareceu tão fechada, que a minha voz jazia presa dentro dela.
Mais quatro dias de tratamento e voltei à possibilidade do diálogo, certificando-me quanto à minha nova situação.
Perguntei, aflita, por meus pais e pelo irmão e obtive a promessa de visitar, em breve tempo, a nossa casa.
Foi breve o tempo de espera que, aliás, me pareceu uma longa fieira de horas amargas, e quando fui defrontada pela retaguarda que me nutria as saudades, fiquei estarrecida, porquanto a Mãezinha Lete caíra em desespero.
Pensava na morte, como se a morte voluntária lhe fosse a única saída daquela problemática de lágrimas que a lembrança do que me sucedera lhe causava.
Pai querido, a dor que lhes vi nos corações me doeu muito mais que as agressões do desastre, em que me vira despojada da própria vida.
Lutei, mas lutei muito, para arredar das idéias da Mãezinha o propósito do suicídio, mas não consegui.
Aquela alma forte e sensível fora ferida nas próprias entranhas, e por muito nos dedicássemos a ela, no sentido de alterar-lhe as
disposições, incapaz de arrebatá-la ao terrível intento, vi-a arrasar o próprio corpo, imaginando que isso lhe abriria as portas da visão para o encontro comigo, quando o gesto dela, desertando da provação, nos agravava o espanto de todos.
Aquelas duas criaturas benditas, que eu já conhecia por vovó Catarina e tia Zunckeller, deram à Mamãe todo o apoio que se improvisa no amparo a uma filha doente, trazendo-a para o nosso convívio.
Médicos e magnetizadores vieram em nosso auxílio, mas a Mãezinha demorou-se para retornar a si mesma.
Agora, já me reconhece, mas trouxe muito desequilíbrio no corpo espiritual, que lhe tornará tempo para desaparecer.
Pai querido, a Mãezinha tem sofrido muito nos remanescentes do suicídio a que se entregou, e agora confessa-me temer por sua sanidade mental e pela sanidade mental do Paulo, e me solicitou pedir-lhes calma e conformação.
Muito ligada ao nosso Paulo, ela me recomendou transmitir-lhe a notícia de que está melhor e de que aguarda com muito carinho a continuidade dele na arte a que se consagrou.
Pai, ela e eu pedimos aos dois, com os nossos corações entrelaçados no mesmo temor para que não alimentem qualquer desejo de encontrar a morte prematura, que vem a ser uma calamidade na vida daqueles que a perpetram, e peco-lhe, tanto quanto ao meu querido irmão, para que vivam e superem os obstáculos que minha Mãe e eu lhes deixamos.
Querido papai Ítalo, confio em sua serenidade e bom senso.
Vim para cá, para Vida Espiritual, porque o meu tempo seria estreito, e a Mãezinha veio em condições difíceis, mas está em franca recuperação, para depois estudar com os Mentores de nossa existência, aqui, a que tarefas se consagrará, de modo a se preparar para o futuro.
Rogo-lhes tomar a vida natural, sem desânimo e sem desesperação.
Hoje, reconheço que somos amparados pela Infinita Bondade de Deus, cujas leis foram criadas em nosso benefício.
Pai, confio em sua maturidade e em sua abençoada vida, e confio na orientação sadia do nosso Paulinho para vencermos quaisquer amarguras que nos visitem os corações.
Agradeço à irmã Joana, à nossa Ana Lúcia e ao nosso amigo Eduardo pela forca que me proporcionaram para falar-lhes com a naturalidade com que o faço, não obstante as nossas limitações.
Peco-lhe dizer ao Paulo que, apesar da prova em que fomos colhidos, não me esqueci de beijar a Mãezinha pelo Dias das Mães, que está chegando.
Não escrevo mais longamente, porque isso não se me faz possível.
Pai querido, com o Paulo, receba todo o coração saudoso de sua filha que lhe será constantemente reconhecida,
Valéria Consentino
***
Apresentado ao Dr. Ítalo Salvador Lourenço Consentino e à Srta. Joana D‟Arc Evangelista, que o acompanhava ao Centro Espírita Batuíra, onde estava-mos escalado para proferir uma palestra evangélico-doutrinária, pelo Presidente daquela casa espírita uberabense, o médium de largos recursos, com uma respeitável folha de serviços prestados à Doutrina, há mais de quarenta anos, Sr. José Pedro Ribeiro, na noite de 26 de maio de 1988, somente no dia seguinte, sábado, fomos entrevistar o ilustre colega, pela manhã, na residência da empresária Joana D‟Arc Evangelista, à Rua Vigário Silva, 51, aqui em Uberaba.
Levamos conosco um Questionário já datilografado, que foi devidamente preenchido pelo Dr. Ítalo, distinto cirurgião e médico legista de Santos, Estado de São Paulo.
Tanto quanto possível, transcreveremos, ipsis litteris, as palavras do distinto genitor de Valéria.

CONTINUA AMANHÃ

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