sábado, 17 de setembro de 2011

SEXO E DESTINO - CHICO XAVIER E ANDRÉ LUIZ - PARTE 76

CONTINUAÇÃO

Gilberto, entrou com a sem-cerimônia de mãe que assiste um filho, sentou-se à beira da cama em que o rapaz se abatera, amuado, e falou-lhe, lacrimosa. Principiou, rogando-lhe desculpas. Em seguida, pediu-lhe permissão para confessar-lhe que ela e Nemésio se amavam, há tempos. E, num rasgo de generosidade que a elevava, mentiu pela felicidade da filha... Comunicou-lhe que, desde muito, se desligara de Cláudio, cuja presença infelizmente não mais tolerava, e declarou que, antes do falecimento de Dona Beatriz, se tornara íntima de Nemésio, com quem se encontrava,
amiúde, em lances clandestinos. Acentuou, com inflexão estudada para impressionar o interlocutor, que errara, lamentavelmente, ao consentir que a jovem se tornasse enfermeira da senhora Torres, porquanto, desde aí, possuía razões para supor que o velho lhe cobiçava a filha. Reconhecendo-o interessado nela, enciumarase... Venerava, porém, a grandeza espiritual de Dona Beatriz, a quem estimava de longe, e tivera forças para aguardar-lhe a morte,
antes de assumir qualquer atitude. Desfeito o impedimento, resolvera abandonar a casa, em definitivo, a ponto de não se incomodar com a menina doente e acompanhar Nemésio a Petrópolis, onde se demoraram juntos em deleitoso refúgio. E continuou justificando, justificando... Agora que ele a surpreendera nos
braços paternos, que lhe perdoasse como um filho, cujo apreço se esmeraria em conservar. Não retornaria ao Flamengo. Desquitarse- ia de Cláudio, de qualquer modo, e, de qualquer modo, partilharia o destino de Nemésio, enquanto Nemésio o permitisse... Mesmo assim, era mãe e rogava-lhe por Marina. Se a amasse, que não lhe desse indiferença ou desprezo, num momento como aquele em que se refazia de dura perturbação. Que a protegesse, fazendo pela menina o que ela, Márcia, não mais conseguiria... A senhora Nogueira finalizara, sinceramente comovida, e vimos sensibilizados os prodígios da compreensão e da bondade num coração juvenil. Olhos chamejantes de júbilo, o rapaz ergueu-se e ajoelhou-se diante daquela mulher que lhe sossegava o (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 295) espírito, com a versão caridosa de que necessitava para reconstituir o caminho.
Em lágrimas de alegria, osculou-lhe as mãos e agradeceu-lhe em palavras quentes de carinho filial. Entendia, sim – comentou –, que o pai, não obstante bondoso, teria obedecido a sugestões de despeito, a fim de apartá-lo da escolhida. Procuraria Marina, prometia olvidar o passado, de modo a não ferir a dignidade maternal com que ela, Dona Márcia, lhe patenteara a nobreza de sentimentos, torturada qual se achava entre a paixão de companheira e o devotamento de mãe. Informou que, na tarde daquele dia, estivera com Marina. Notara-lhe a sinceridade e a tristeza.
Fora rude com ela, espezinhara-lhe o coração, mas voaria naquela mesma hora para o Flamengo e fariam as pazes. Quanto ao futuro, não tinha motivos para incompatibilizar-se com Cláudio; entretanto, já que o desquite se fazia iminente, envidaria todos os esforços para que o genitor e Dona Márcia se consorciassem num país onde o divórcio merecesse aprovação legal.
Da entrevista ao telefone e do telefone a novo encontro com Marina, foi para Gilberto questão de minutos.
Perante os jovens reunidos, Nogueira enlevou-se, regozijando-se em preces de reconhecimento.
Moreira e eu expedimos informações para o irmão Félix, que veio, na noite do dia seguinte, compartilhar-nos as orações de alegria.
Depois de abraçar Cláudio e os dois namorados que demandavam Copacabana, à busca do convívio de Salomão, o benfeitor rumou para a Lapa, em nossa companhia.
Márcia, recostada num divã, fumava cismando, na expectativa da chegada de Nemésio para jantarem na Cinelândia, com um filme subseqüente, mas Félix, magnânimo como sempre, acercou (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 296) se dela, ignorando as baforadas, e beijou-lhe a fronte, mostrando lágrimas...
Não dispúnhamos de estatura espiritual para auscultar-lhe os pensamentos sublimes. Observamos apenas que ele a contemplou, enlevado, como quem lhe agradecia a inesperada abnegação, e murmurou, ao despedir-se: – Louvado seja Deus!
Do dia imediato em diante, azedou-se o intercâmbio entre pai e filho. Nemésio, intrigado; Gilberto, arredio. E, decorridas algumas semanas, ao inteirar-se de que o rapaz e a menina Nogueira passeavam de relações reatadas, o negociante viajou para o sul, em companhia de Márcia, no intuito de situar o filho junto de antigos camaradas de juventude, residentes em Porto Alegre. Por lá se deteve o par, semanas e semanas, trazendo, na volta, expressivo programa de serviço e de estudo que Gilberto, convidado pelo genitor a entendimento, recusou, cortês, desistindo das vantagens que lhe eram oferecidas.
Presenciando-lhes o diálogo em ambiente fechado, consignamos a respeitosa ternura com que o jovem se dirigiu ao genitor, implorando-lhe auxílio. Tivesse a bondade de não transferi-lo, que o deixasse no Rio. Rogava desculpas se o magoava, mas reconhecia-se em maioridade e aspirava ao casamento com Marina, de quem se reaproximara. Desde cedo, acostumara-se a trabalhar com o pai, a colaborar com ele, na imobiliária. Aguardava-lhe, por isso, a proteção.
Nemésio ouvia, ressentido, revoltado. Marina reconquistada pelo filho significava para ele bancarrota moral insuportável.
Nunca a amara tanto, quanto naquela hora em que se lhe esvaiam as esperanças. Entrevia-se calcado, vencido. A pouco e pouco se desinteressara de Márcia, conquanto a conservasse. Marina significava-lhe mocidade, euforia, entusiasmo, improvisação. Justamente (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 297) quando ruminava desígnios de recuperar-lhe o carinho, adiantava-se o filho, frustrando-lhe os projetos.
Certificando-se de que Gilberto concluíra, vibrou rude golpe na mesa com uma régua pesada e, enceguecido pela cólera que o envolvia por juba de fogo, esbravejou: – Nunca!... Você nunca se casará com essa... E multiplicou pejorativos e desaforos que o moço agüentou, estonteado e ferido. Mesmo assim, depois da tirada de injúrias, retorquindo aos apelos e intimações de última instância, assegurou que saberia tolerar todas as conseqüências, mas não renunciaria ao compromisso que assumira consigo próprio.
O genitor, possesso, entregou-se às vias de fato, esmurrandolhe o rosto.
Gilberto rodou nos calcanhares e tombou no piso, para reerguer-se e cair de novo sob pancadaria grossa, até que Nemésio, semelhando fera solta, infligiu-lhe tremendo chute, vociferando: – Rua, miserável!... Rua, rua!... Suma daqui! Não me apareça mais!...
Acompanhamos o menino atônito, que alcançou a via pública tentando estancar com o lenço um filete de sangue a escorrer-lhe num dos cantos da boca.
Daí a quarenta minutos, um ônibus despejava-nos no Flamengo.
Os Nogueiras terminavam o almoço e, antes de rumar para o banco, Cláudio recolheu, junto da filha, o relatório doloroso.
O trio machucado entendia perfeitamente a gravidade da situação.
Nogueira, porém, ofereceu-se para ajudar. Diligenciaria obter para Gilberto um emprego no estabelecimento de crédito em que trabalhava. Considerava o dirigente por amigo. Solicitar-lhe-ia

CONTINUA AMANHÃ

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