terça-feira, 23 de agosto de 2011

SEXO E DESTINO - CHICO XAVIER E ANDRÉ LUIZ =- PARTE 51


CONTINUAÇÃO

CAPÍTULO 4

Debaixo da agressão, Marina experimentou irreprimível malestar.
Empalideceu. Sentia-se sufocar. Registrava todos os sintomas de quem recebera pancada forte no crânio. Jogou a cabeça para trás, na poltrona, esforçando-se por esconder a indisposição, mas debalde. Os Torres, pai e filho, perceberam-lhe a vertigem e acorreram, pressurosos.
Nemésio tomou a palavra, atribuindo o desmaio à fadiga de quem se movimentara durante a noite inteira, sem o mínimo descanso no decorrer do dia anterior, ao redor da dona da casa, cujo
corpo se consumia com dolorosa lentidão, ao passo que Gilberto trazia água fresca, antes de telefonar para o médico.
No ambiente espiritual, o impacto não foi menos constrangedor.
Neves fitou-me, irrequieto, como a rogar socorro para não explodir. Conhecia Moreira, de nossa primeira visita ao Flamengo; entretanto ignorava os acontecimentos que nos apoquentavam, desde a antevéspera. Pelo olhar de censura que nos arremessou, concluí que julgava o aposento da filha invadido por malfeitores desencarnados, numa investida sem qualquer significação, incapaz de ajuizar quanto às causas que impeliam o ex-conselheiro de Cláudio àquele gesto de revolta, para o qual arrebanhara colegas infelizes, efetuando um ataque categorizado por ele à conta de
empreitada punitiva e justiceira.
Uma das senhoras desencarnadas, que aguardava o momento de acolher Beatriz, liberta, abordou-me, pedindo providências.
Moreira e os aderentes despejavam ditérios e obscenidades, injuriando a dignidade do recinto, depois de haverem burlado a vigilância mantida em torno da casa. Não formulava o pedido para que se articulasse a contenção deles, a propósito de preconceitos (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 202) humanos. Aceitava os recém-chegados na posição de credores da maior comiseração; no entanto, a senhora Torres estava nas derradeiras orações, em vias de partir. Esmolava tranqüilidade, silêncio.
Em determinadas terapêuticas, não se pode restabelecer a normalidade orgânica senão removendo o centro de infecção e, ali, o pivô da desarmonia era Marina.
Afastada a moça, retirar-se-iam com ela os agentes da desordem.
Abeirei-me da menina carecedora de piedade. Supliquei-lhe saísse. Fosse repousar. Não teimasse ante a solicitação nossa em seu proveito.
Ela obedeceu a contragosto.
Pediu licença aos amigos, a fim de esperar o médico na dependência dos fundos, e acompanhei-a.
O bando, porém, renteou comigo e Moreira interpelou-me.
Queria saber de minha simpatia pela jovem que ele hostilizava.
Indagava, desabrido, se eu não a conhecia suficientemente, se não lhe assistia às bacanais entre pai e filho e por que me interessava de modo tão especial por aquela a que ele chamava bisca, bonita por fora e devassa por dentro.
Ironizando-me a escassa inclinação à conversa, reportou-se, com enérgicas rabecadas, à dama que nos havia rogado a execução de medidas para afastá-lo do quarto, declarando que não era covarde para incomodar moribundos, e perguntou, insolente, por que razão as entidades veneráveis e amigas, que ele apelidava por “aquelas mulheres”, nos compeliam a retirá-lo, quando ali deixavam Marina respirar à vontade, acentuando que, por ser franco e áspero, não se considerava pior.
Crivou-me de objurgações repassadas de fel. (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 203)
Desafiando-me, por fim, a enunciar o meu ponto de vista, utilizando palavras que colocavam em jogo a confiança com que me honrava, desde a véspera, arrisquei-me a ponderar que Marina, apesar de tudo, era filha de Cláudio Nogueira e irmã de Marita, aos quais tributávamos ambos calorosa afeição. Qualquer fracasso em prejuízo dela seria desastre para eles. Não me cabia reprovar corrigendas, capazes de lhe fortalecer a vigilância, com manifesta vantagem para ela; no entanto, por amizade aos Nogueiras, não concordaria em que fosse massacrada.
Ele sorriu e obtemperou que as apreciações não eram de todo desprovidas de senso, prometendo que amainaria o desforço, mas não desistiria da correção.
Despachou os cooperadores, recomendando aos quatro lhe aguardassem as ordens no pátio lateral, e acompanhou-nos, segurando-a, descortês.
Indiferente a qualquer idéia de companhia espiritual, Marina penetrou na câmara, encostou a porta e ajeitou-se no leito, cerrando os olhos. Relaxou-se.
Aspirava a dormir, descansar... Mas não conseguiu.
Moreira, insensível, indicando o propósito de arrasar em mim qualquer simpatia pela contadora indefesa, participou-me que ia submetê-la a interrogatório, em torno de Marita, para que eu lhe ouvisse o depoimento inarticulado e avaliasse o caso por mim mesmo.
Suspirei pela obtenção de respostas que enobrecessem o inquérito mental em preparo; contudo, minhas esperanças se desvaneceram no nascedouro.
O indesejável patrocinador de Marita, erguido por si mesmo à condição de juiz, pespegou um pejorativo contundente aos ouvidos da moça e reclamou-lhe a opinião, sobre a irmã hospitalizada. (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 204)
Que se manifestasse, que expusesse o seu ponto de vista, quanto àquele suicídio comovedor.
Marina, embora debilitada, conjeturou-se tangida pelos próprios pensamentos a lhe buscarem atenção para a irmã acidentada e, presumindo monologar, deixou que os pensamentos lhe pululassem do cérebro, sem o travão da autocrítica.
Compadecia-se da irmã – parafusava, calculista –, no entanto, confessava-se agradecida ao destino por se ver livre dela. Indiscutivelmente, não teria tido coragem de impeli-la à morte; todavia, se ela própria deliberara desaparecer, cedendo-lhe posição, sentiase aliviada. Gilberto inteirara-a de um telefonema que recebera na noite da antevéspera. Confiara-lhe as impressões. Nada de trote.
Pelo jeito, deduziram que Marita lhe imitara a voz, efetuando sondagem... Convencida de que o rapaz não a desejava, preferira morrer. Gilberto fora claro. Pelos tópicos da conversação pelo fio, dos quais lhe transmitira os mínimos pormenores, Marita investigara-lhe os sentimentos, no intuito de arrancar-lhe uma declaração indireta. Desiludida, optara pela renúncia. Em razão de tudo isso, não lhe cabia perder-se em divagações. Se o jovem Torres a amava, no mesmo grau de carinho com que se lhe entregara, e se a outra resolvera sumir, nenhum motivo para ralar-se. O próprio Gilberto, semanas antes, perguntara-lhe, de estranha maneira, pelas esquisitices da irmã. Julgava-a desequilibrada, neurótica, ao que se lhe referira à paternidade anônima. O filho de Nemésio acreditava em sífilis na cabeça, asseverando que Marita não servia para casar.
Após ligeira pausa no pensamento, como quem apaga uma luz e a reacende, alterando o cenário, a jovem do Flamengo seguiu pensando, memorizando... Telefonara para casa, durante a noite, e a mãezinha informara que Manta ainda não havia morrido; contudo, o médico esclarecera a ela, Dona Márcia, em ligação confidencial, que a Ciência não

CONTINUA AMANHÃ

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