quinta-feira, 14 de julho de 2011

SEXO E DESTINO - CHICO XAVIER E ANDRÉ LUIZ

CONTINUAÇÃO

Em várias ocasiões, estudara a passagem do Espírito exonerado do envoltório carnal pela matéria espessa. Eu mesmo, quando me afazia, de novo, ao clima da Espiritualidade, após a desencarnação última, analisava impressões ao transpor, maquinalmente, obstáculos e barreiras terrestres, recolhendo, nos exercícios feitos, a sensação de quem rompe nuvens de gases condensados.
Ali, no entanto, produzia-se algo semelhante ao encaixe perfeito. Cláudio-homem absorvia o desencarnado, à guisa de sapato que se ajusta ao pé. Fundiram-se os dois, como se morassem eventualmente num só corpo. Altura idêntica. Volume igual.
Movimentos sincrônicos. Identificação positiva.
Levantaram-se a um tempo e giraram integralmente incorporados um ao outro, na área estreita, arrebatando o delgado frasco.
Não conseguiria especificar, de minha parte, a quem atribuir o impulso inicial de semelhante gesto, se a Cláudio que admitia a instigação ou se ao obsessor que a propunha.
A talagada rolou através da garganta, que se exprimia por dualidade singular. Ambos os dipsômanos estalaram a língua de prazer, em ação simultânea.
Desmanchou-se a parelha e Cláudio, desembaraçado, se dispunha a sentar, quando o outro colega, que se mantinha a distância, investiu sobre ele e protestou: “eu também, eu também quero!”
Reavivou-se-lhe no ânimo a sugestão que esmorecia..
Absolutamente passivo diante da incitação que o assaltava, reconstituiu, mecanicamente, a impressão de insaciedade.
Bastou isso e o vampiro, sorridente, apossou-se dele, repetindo-se o fenômeno da conjugação completa. (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 51).
Encarnado e desencarnado a se justaporem. Duas peças conscientes, reunidas em sistema irrepreensível de compensação mútua.
Abeirei-me de Cláudio para avaliar, com imparcialidade, até onde sofreria ele, mentalmente, aquele processo de fusão.
Para logo convenci-me de que continuava livre, no íntimo.
Não experimentava qualquer espécie de tortura, a fim de renderse.
Hospedava o outro, simplesmente, aceitava-lhe a direção, entregava-se por deliberação própria. Nenhuma simbiose em que se destacasse por vítima. Associação implícita, mistura natural.
Efetuava-se a ocorrência na base da percussão. Apelo e resposta.
Cordas afinadas no mesmo tom. O desencarnado alvitrava, o encarnado aplaudia. Num deles, o pedido; no outro, a concessão.
Condescendendo em ilaquear os próprios sentidos, Cláudio acreditou-se insatisfeito e retrocedeu, sorvendo mais um gole.
Não me furtei à conta curiosa. Dois goles para três.
Novamente desimpedido, o dono da casa estirou-se no divã e retomou o jornal.
Os amigos desencarnados tornaram ao corredor de acesso, chasqueando, sarcásticos, e Neves, respeitoso, consultou sobre responsabilidade.
Como situar o problema? Se víramos Cláudio aparentemente reduzido à condição de um fantoche, como proceder na aplicação da justiça? Se ao invés de bebedice, estivéssemos diante de um caso criminal? Se a garrafa de uísque fosse arma determinada, para insultar a vida de alguém, como decidir? A culpa seria de Cláudio que se submetia ou dos obsessores que o comandavam?
O irmão Félix aclarou, tranqüilo: (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 52)
– Ora, Neves, você precisa compreender que nos achamos à frente de pessoas bastante livres para decidir e suficientemente lúcidas para raciocinar. No corpo físico ou agindo fora do corpo físico, o Espírito é senhor da constituição de seus atributos. Responsabilidade não é título variável. Tanto vale numa esfera, quanto em outras. Cláudio e os companheiros, na cena que acompanhamos, são três consciências na mesma faixa de escolha e manifestações conseqüentes. Todos somos livres para sugerir ou assimilar isso ou aquilo. Se você fosse instado a compartilhar um
roubo, decerto recusaria. E, na hipótese de abraçar a calamidade,
em são juízo, não conseguiria desculpar-se.
Interrompeu-se o mentor, volvendo a refletir após momento rápido:
– Hipnose é tema complexo, reclamando exames e reexames de todos os ingredientes morais que lhe digam respeito. Alienação da vontade tem limites. Chamamentos campeiam em todos os caminhos. Experiências são lições e todos somos aprendizes.
Aproveitar a convivência de um mestre ou seguir um malfeitor é deliberação nossa, cujos resultados colheremos.
Verificando que o orientador se dava pressa em ultimar os esclarecimentos sem mostrar o mínimo propósito de afastar as entidades vadias que pesavam no ambiente, Neves voltou à carga, no intuito louvável do aluno que aspira a complementar a lição.
Pediu vênia para repisar o assunto na hora.
Recordou que, sob o teto do genro, o irmão Félix se esmerava na defesa contra aquela casta de gente. Amaro, o enfermeiro prestimoso, fora situado junto de Beatriz principalmente para correr com intrometidos desencarnados. O aposento da filha tornara-se, por isso, um refúgio. Ali, no entanto...
E perguntava pelo motivo da direção diversa. (Francisco Cândido Xavier - Sexo e Destino - pelo Espírito André Luiz 53).
Félix expressou no olhar a surpresa do professor que não espera apontamento assim argucioso por parte do discípulo e explicou que a situação era diferente.
A esposa de Nemésio mantinha o hábito da oração. Imunizava-se espiritualmente por si. Repelia, sem esforço, quaisquer formas-pensamentos de sentido aviltante que lhe fossem arremessadas.
Além disso, estava enferma, em vésperas da desencarnação.
Deixá-la à mercê de criaturas insanas seria crueldade. Garantias concedidas a ela erguiam-se justas.
– Mas... e Cláudio? – insistiu Neves. – Não merecerá, porventura,
fraterna demonstração de caridade, a fim de livrar-se de tão temíveis obsessores?
Félix sorriu francamente bem-humorado e explicou:
– “Temíveis obsessores” é a definição que você dá. – E avançou:
– Cláudio desfruta excelente saúde física. Cérebro claro, raciocínio seguro. É inteligente, maduro, experimentado. Não carrega inibições corpóreas que o recomendem a cuidados especiais.
Sabe o que quer. Possui materialmente o que deseja. Permanece no tipo de vida que procura. É natural que esteja respirando a influência das companhias que julgue aceitáveis. Retém liberdade
ampla e valiosos recursos de instrução e discernimento para juntar-
se aos missionários do bem que operam entre os homens, assegurando edificação e felicidade a si mesmo. Se elege para comensais da própria casa os companheiros que acabamos de ver, é assunto dele. Enquanto nos arrastávamos, tolhidos pela carne, não nos ocorreria a idéia de expulsar da residência alheia as pessoas que não se harmonizassem conosco. Agora, vendo o mundo e as coisas do mundo, de mais alto, não será cabível modificar semelhante modo de proceder.
O tema desdobrava-se, assumindo aspectos novos.
Curioso, interferi:

CONTINUA AMANHÃ

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