quinta-feira, 9 de junho de 2011

AS VIDAS DE CHICO XAVIER - OS MORTOS ESTÃO VIVOS - PARTE 5

CONTINUAÇÃO

Desde a separação, Waldo Vieira nunca mais se encontrou com o antigo parceiro.
Em 1991, tentou conversar com ele. Os auxiliares de Chico afastaram-no com uma desculpa: Chico estava viajando. O "completista " preferiu ficar em casa, sozinho, recolhido em seu quarto, escrevendo.
Tinha mais o que fazer.
Em 1967, Chico lutava para atingir o centésimo livro e encerrar a maratona literária. Estava exausto. Logo após a separação, colocou no papel o livro Encontro Marcado, assinado por Emmanuel. Uma coletânea de conselhos bastante úteis para quem, como ele, sofria com mais um desencontro na vida. Uma das frases era consoladora: "A pedra que acidentalmente nos fira será provavelmente a peça que sustentará a segurança da construção ".
O autor de 92 livros, muitos deles já traduzidos para o espanhol, esperanto e inglês, nem teve tempo para se lamentar. Aquele era o ano do quadragésimo aniversário de sua mediunidade. E os espíritas estavam em festa. Os fãs mais exaltados faziam Chico recorrer à ironia ao chamá-lo de papa do espiritismo.
Só se for a papa do angu na panela.
Até o padre Sinfrônio, de Pedro Leopoldo, fez as pazes com o conterrâneo. Ele hasteou a bandeira branca e convidou o "rival " a participar de um encontro de educadores promovido pela Escola da Imaculada Conceição. Naquele ano, Chico recebeu o título de cidadania da cidade natal e, com lágrimas nos olhos, agradeceu a todos por tudo, logo após afirmar não merecer tamanha honraria. Era o primeiro de uma série quase interminável de títulos. No ano seguinte, seria a vez de Uberaba dar o título a seu morador mais ilustre. Os donos de hotéis apoiaram com fervor...
Chico agradecia as homenagens, atribuía todo o crédito aos espíritos e a Emmanuel e gerava ensaios científico espirituais. Um deles, assinado pelo professor Herculano Pires, definia o quase sessentão como um "ser interexistente ". alguém capaz de existir no  "aqui e no agora " como homem no mundo e, no além, como  "homem fora do mundo ". Alguém capaz de experimentar, ao mesmo tempo, duas vidas: a de vigília e a hipnótica. Um  "médium humilde desprezado e depreciado pela inteligência brasileira  ".
Os mais matemáticos calculavam: nos quarenta anos de mediunidade, Chico teria ficado o correspondente a oito anos em transe.
Chico demorou a entender o tal conceito de interexistência.
Foi preciso Herculano morrer para Chico decifrar a expressão.
Ele passava para o papel, em sessão pública, o recado de um rapaz morto para sua mãe, quando escutou o convite de um "  espírito amigo  ":
- Precisamos de você neste instante numa reunião no plano espiritual. Por favor, me acompanhe até lá.
Com a permissão de Emmanuel, sem ninguém notar, ele se retirou da sala, deixou seu corpo na cadeira e andou quilômetros até chegar a um salão. Lá dentro, todos estavam em silêncio. O presidente da sessão: Herculano Pires. Chico soube, em pensamento, que deveria substituir um médium ausente. Uma mãe aflita esperava notícias de seu filho. Os dois estavam mortos, mas em planos diferentes. Enquanto seu corpo psicografava uma mensagem em Uberaba, ele passava para o papel outro texto em um ponto qualquer do espaço.
Após a dupla jornada de trabalho, o professor se aproximou e perguntou:
Você entendeu agora o que é ser interexistente?
Como presente de aniversário mediúnico, Chico ganhou de Emmanuel mais responsabilidade. Daquele ano em diante, ele teria autorização para colocar no papel, com assiduidade, em sessões públicas, os textos ditados pelos mortos a suas famílias. Chico sairia da fase do varejo e iria para o estágio do atacado na chamada  "literatura de consolação  ". A cada semana, ele poria no papel a média de três mensagens particulares. A nova missão talvez substituísse em breve a dos livros, quando ele concluísse seu centésimo título.
E era uma tarefa arriscada. A tensão dos parentes em busca de notícias de seus mortos chegava ao descontrole. Numa noite, em sessão pública, um espírita, amigo de Chico Xavier, duvidou de uma mensagem mandada por um familiar do outro mundo e cuspiu no rosto do médium. Chico se enxugou com um lenço, desabafou com amigos e, em casa, chorou. Emmanuel apareceu. Em vez de palavras de consolo, mais uma ordem:
- - Quando alguém cuspir em seu rosto, diga simplesmente que a chuva molhou sua face, se alguém pedir explicações. Não reclame.
Chico evitava as queixas e escrevia sem parar, apesar das dores provocadas por um tumor na próstata. Agüentou o sofrimento enquanto pôde. Mas a cirurgia era inevitável.
Zé Arigó, o médium que incorporava o Dr. Fritz e realizava cirurgias sem anestesia, se ofereceu para operar o colega. Chico recusou a oferta e preferiu se internar numa clínica em São Paulo. Antes, tomou o cuidado de entregar ao Dr. Elias Barbosa documentos particulares.
- Ninguém sabe o que pode acontecer.
Ele foi para o centro cirúrgico e provocou mais uma polêmica. Por que não aceitou a oferta do Dr. Fritz, tão requisitado na época? Ele duvidava do poder dos espíritos?
O protegido de Emmanuel se limitou a repetir a mesma resposta dada a Arigó:
- Como eu ficaria diante de tanto sofredor que me procura e que vai a caminho do bisturi como o boi para o matadouro? E eu vou querer facilidades? Eu tenho que me operar como os outros, sofrendo como eles.
Anos mais tarde, num desabafo, Chico deixaria de lado a diplomacia e diria:
- Sou contra essa história de meter o canivete no corpo dos outros sem ser médico. O médico estudou bastante anatomia, patologia e, por isso, está habilitado a fazer uma cirurgia. Por que eu, sendo médium, vou agora pegar uma faca e abrir o corpo de um cristão sem ser considerado um criminoso?
Já recuperado da cirurgia de próstata, Chico recebeu outra orientação de seu guia: às vésperas de concluir seu livro número cem, ele poderia dar entrevistas na TV para atingir um número maior de pessoas. No dia 6 de maio de 1968, ele conversou com o repórter Saulo Gomes, da TV Tupi de São Paulo, na Comunhão Espírita Cristã.
Deu uma aula de espiritismo. Para ele, os sovinas, ao guardarem dinheiro, operavam no organismo social o correspondente a uma trombose na circulação do sangue. A caridade era uma boa saída. O suicídio gerava conseqüências desastrosas. Ele reencontrou amigos suicidas, mortos com tiros no ouvido, reencarnados como "crianças retardadas em estado de extrema idiotia ". No final, Chico colocou no papel, de olhos fechados, em velocidade, um texto assinado por Emmanuel. Temperada por revelações e surpresas do outro mundo, a entrevista fez tanto sucesso que acabou sendo exibida em quase todas as capitais.
Chico não sabia, mas aquele era apenas um ensaio para a maratona televisiva dos anos 70.

CONTINUA AMANHÃ

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