quarta-feira, 8 de junho de 2011

AS VIDAS DE CHICO XAVIER - OS MORTOS ESTÃO VIVOS - PARTE 4

CONTINUAÇÃO

Rezou e chorou. Antes de voltarem ao Brasil, passaram por Lisboa, onde deixaram textos escritos em bom português. Num deles, assinado por Emmanuel, vinha a convocação.
- Atendamos à caridade que suprime a penúria do corpo, mas não menosprezemos o socorro às necessidades da alma. Divulguemos a luz da Doutrina Espírita. Auxiliemos o próximo a discernir e pensar.
Chico repetia palavras de Cristo: Conhecereis a verdade e a verdade vos fará livres.
Emmanuel completava com mão de ferro: os mortos estão vivos. Livres para sermos felizes em nossas obrigações e para sermos mais responsáveis perante Deus.
Nessa primeira viagem, Chico e Waldo lançaram sementes kardecistas no exterior. No ano seguinte, eles voltaram aos Estados Unidos para fiscalizar a plantação. Antes de partir, em abril, Chico pediu a retificação de seu nome. Estava cansado de usar, em documentos oficiais, o Francisco de Paula Cândido. O juiz Fábio Teixeira Rodrigues Chaves autorizou. E a certidão de nascimento dele, em Pedro Leopoldo, mereceu um reparo na margem direita ao lado do registro original: onde está o nascimento de Francisco de Paula Cândido, fique constando Francisco Cândido Xavier.
Com seu "nome artístico " reconhecido, ele viajou disposto a dar um passo importante: o lançamento da versão em inglês do livro Ideal Espírita. Para atrair mais leitores, o título se transformou em The World of The Spirits e chegou às lojas com o selo da respeitada Philo-sophycal Library. Chico ficou eufórico. A viagem era um sucesso.
Mrs. Phillis Haddad contribuiu para o otimismo do espírita. Inspirada, ela deu provas de estar em sintonia com o outro mundo e tocou num dos pontos mais sensíveis de Chico: colocou no papel recados assinados por uma certa Maria João de Deus.
Aos espíritas já irritados com a badalação da dupla no exterior, a FEB apresentou, em sua revista O Reformador, um artigo assinado por Salim Salomão intitulado: "Por que Estados Unidos ".
Era quase um pedido de desculpas pelo sumiço dos dois: Os guias espirituais dos infatigáveis médiuns apontaram-lhes a necessidade de aprendizado da língua inglesa a fim de que as recepções de mensagens nesse idioma se tornem menos difíceis e mais rápidas. Daí também a necessidade de suas ausências do Brasil e do seu treinamento intensivo em estudos do inglês, o que vêm fazendo com admirável progresso, pontualidade e dedicação.
A viagem renderia. Livros como Agenda Cristã e Nosso Lar seriam vertidos para o inglês, japonês e tcheco. O kardecismo começaria a engatinhar nos Estados Unidos.
Um Centro de Sheilla seria inaugurado em Miami, ao lado de outros dois centros. Nova York sediaria três casas espíritas, a Califórnia ficaria com duas e Filadélfia com outra nos trinta anos seguintes. Nada muito estimulante. The World of The Spirits venderia, no primeiro ano, 216 exemplares. Chico achou ótimo.
Antes de voltar ao Brasil, o porta voz dos mortos visitou outro cemitério, o Memorial Park, em Hollywood. Estava no local certo na hora exata. Embaixo de uma árvore, com a cabeça no colo de uma senhora, descansava, a cerca de dez metros de seu túmulo, a mulher mais trepidante daquela época, a sexy symbol Marilyn Monroe. A precursora de Madonna já estava enterrada há três anos e a imprensa ainda debatia hipóteses sobre as circunstâncias de sua morte por overdose de tranqüilizantes, no auge do sucesso, aos 36 anos.
A maioria defendia a tese do suicídio puro e simples. Outros falavam em acidente - a loura fatal não queria morrer quando misturou altas doses do tranqüilizante Nembutal com álcool. Os mais criativos arriscavam teorias bem mais arrojadas: a atriz tinha sido vítima de um complô. Máfia, FBI, Os Kennedy, Fidel Castro? Siglas e nomes vieram à tona.
Pois bem. Marilyn Monroe iria falar.
Chico Xavier, de Pedro Leopoldo, viu quando seu velho conhecido, o repórter Humberto de Campos, se aproximou da estrela.
- Sou um amigo do Brasil que deseja ouvi-la.
- Um brasileiro a procurar-me depois da morte? Em que poderia ser útil?
A mulher mais esfuziante dos últimos tempos estava irreconhecível. Na conversa, bastante reveladora, ela tratou de desmentir os boatos sobre seu suicídio. Os vivos falam sobre os mortos o que lhes vêm à cabeça, sem que os mortos possam lhes dar a resposta devida.
Depois do desabafo, ela apresentou sua versão: Ingeri, quase semi inconsciente, sob profunda depressão, os elementos mortíferos que me expulsaram do corpo, na suposição de que tomava uma simples dose de pílulas mensageiras do sono.
Isso mesmo: os adeptos da tese do acidente acertaram.
Rica, irresistível, famosa, Marilyn vivia desorientada. E, com conhecimento de causa, após um período de mea culpa no além, tratou de dar um conselho às mulheres: Não se iludam a respeito da beleza e fortuna, emancipação e sucesso. Isso dá popularidade e popularidade é um trapézio no qual raras criaturas conseguem dar espetáculo de grandeza moral, incessantemente, no circo do cotidiano.
Após recorrer à metáfora circense, ela tratou de definir a liberdade como um bem que deveria ser administrado com bom senso, O sexo, "canal de renascimento e renovação ", poderia ser guiado para as "trevas " e "tumultuado por inteligências animalizadas ", nos níveis mais baixos de evolução, se não fosse respeitado por "sensata administração de valores ".
Marilyn Monroe só não gostava de lembrar o momento de sua morte:
Quando minha governanta bateu na porta do quarto, inquieta ao ver a luz acesa, acordei sentindo-me duas pessoas a um só tempo. Gritei apavorada sem saber, de imediato, identificar-me.
- Seus planos para o futuro?
- Primeiro quero melhorar. Em seguida, como a aluna no educandário da vida, preciso repetir as lições e provas em que falhei. Por agora não devo e nem posso ter outro objetivo que não seja reencarnar, lutar, sofrer e reaprender.
Humberto agradeceu pela entrevista exclusiva e Marilyn voltou para o colo de sua companheira.
Chico Xavier chegou a Uberaba com a entrevista bomba assinada pelo Irmão X e com uma outra novidade também surpreendente: estava sozinho. Waldo Vieira tinha ido para o outro lado do mundo, o Japão. Iria fazer um curso de pós graduação em plástica e cosmética em Tóquio. Meses depois, ele voltaria para a Comunhão Espírita Cristã apenas para arrumar as malas e sumir do mapa em direção ao Rio, onde abriria um consultório.
Chico Xavier garantia estar conformado com a separação. E previa em entrevistas na época: Waldo será invariavelmente o médico humanitário e o abnegado missionário da doutrina espírita que todos nós conhecemos.
Errou em cheio.
Após deixar sua assinatura ao lado da de Francisco Cândido Xavier em dezessete livros, o "médico humanitário " virou as costas para o espiritismo,  "estreito demais ", e seguiu carreira solo. Estava cansado de Chico, "tão frágil, tão suscetível, tão chorão ", estava cansado da sacralização em torno de seu parceiro e do  "populismo   " das sopas diárias, das peregrinações semanais e das distribuições natalinas.
Queria distância da culpa cristã, da caridade, das lições evangélicas. Ele não iria se conformar, não iria agradecer a Deus por seus sofrimentos, não viveria atrelado a guias espirituais, não se submeteria a ser um eterno datilógrafo de textos do além.
Waldo abandonou a doutrina espírita e definiu sua saída da Comunhão como "uma benção ". Leitor voraz, dono de uma biblioteca com 60 mil exemplares, ele fundaria não uma seita, mas uma ciência batizada de  "projeciologia ". Iria estudar as projeções de consciência, as experiências fora do corpo físico. Em 1986, lançaria um livro sobre o assunto - um calhamaço de mil páginas coberto por 1.907 citações extraídas de mais de 5.500 títulos específicos.
Os cientificismos de André Luiz, no complexo Mecanismos da Mediunidade, são até bastante acessíveis se comparados à linguagem usada no mundo novo de Waldo. Tanto que ele lançaria um  "miniglossário da conscienciologia " para quem quisesse entender seu dialeto. No livro de bolso, o leitor teria acesso a informações como esta:
"Acoplamento áurico interfusão das energias holochacrais entre duas consciências " .
Mas o que é holochacra? O livro explica: "Paracorpo energético da conscin ".
Conscin? Isso mesmo, a "consciência intrafísica a personalidade humana, o cidadão ou cidadã da Socin  ".
Nesse universo sofisticado, a mediunidade é considerada um "pré maternal, uma bobagem ", o espiritismo não passa de uma superstição e Kardec já está superado.
A pessoa capaz de projetar a própria consciência estaria anos luz à frente do médium. A projeciologia eliminaria o intermediário, o atravessador. Se uma pessoa quisesse entrar em contato com o "espírito ", por exemplo, bastaria sair conscientemente de seu corpo físico e procurar seu morto em outra dimensão. Ou seja: a mãe, arrasada com a morte de seu filho, poderia fazer um curso de projeciologia, treinar bastante e ir para o espaço. Haveria o risco de ela se perder no meio do caminho.
- Mas quem não corre riscos? pergunta Waldo.
Quase 27 anos após se tornar um dissidente de Chico Xavier, Waldo só interromperia os ataques para confirmar: Emmanuel e André Luiz existem mesmo. A mediunidade e a psicografia são reais.
Chico Xavier seria um "completista ", segundo termo inventado por André Luiz. Ou seja: cumpriu à risca a programação traçada no outro mundo para ele.
Com longas barbas brancas e seu discurso demolidor, Waldo Vieira seria acusado por vários espíritas de estar cercado de espíritos obsessores. Ao saber das acusações, ele se limitaria a gargalhar.
- Eu ameaço o espiritismo. Eu acabo com os atravessadores.
Os espíritas mais indignados chegaram a prever a   "desencarnação  " do ex médium.
Ele teria traído sua missão e poderia pagar por isso. Waldo provocaria:
- Eu só tenho medo do espírito obsessor do cachorro do vizinho.
Em seu último livro, 600 Experimentos da Conscienciologia, Waldo dedicou um capítulo a Jesus Cristo. E lançou uma série de adjetivos implacáveis contra o homem mais importante do espiritismo e mais adorado por Chico Xavier. Para o ex parceiro de Chico, JC (como ele chama Jesus) é um  "teólatra populista inamovível ". um "catequista inveterado e fanático ", um "rezador de retiros espirituais ", um "autopromotor da autolatria cega ", um "doutrinador e repressor acrítico ", um "sectarista ginecófobo apaixonado   ".

CONTINUA AMANHÃ

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