sexta-feira, 3 de junho de 2011

AS VIDAS DE CHICO XAVIER - A NOVA ATRAÇÃO DE UBERABA - PARTE 2

CONTINUAÇÃO

Suas idas à igreja estavam cada vez mais escassas. Conversou com Chico Xavier sobre o projeto e ficou decepcionada. Ele pediu calma. A idéia era prematura. Olina ainda precisava levar bons sustos.
Numa noite, sua amiga, Joventina, deu à luz uma menina. Chico foi até sua casa para uma visita e lhe ofereceu uma surpresa, um presente de Sheilla. Quando ele pronunciou o nome da enfermeira morta na Segunda Guerra, o quarto se encheu de perfume.
Olina procurou o frasco de onde vinha o aroma e não encontrou. Chico não se moveu. Segurava as mãos de Joventina, deitada na cama.
Após deixar no ar o seu presente, Chico foi até a casa de Maria Olina. No caminho, passou por duas fogueiras de São João próximas à igreja e comentou:
- Que coisa mais linda aquele povo em volta do fogo. Está tão feliz junto com os nossos apóstolos.
Maria Olina ficou feliz da vida. A mistura de espiritismo com catolicismo soava muito bem.
Já em casa, a anfitriã apresentou sua mãe ao visitante ilustre. Chico grudou os olhos naquela senhora humilde e ficou calado o tempo todo, distante e atento ao mesmo tempo. Olina voltou ao assunto: queria ensinar o Evangelho em sua casa. Chico concordou, mas fez uma ressalva: o curso deveria acontecer no barracão onde a mãe dela morava, no quintal, e não onde eles estavam.
Olina bateu o pé. Chico Xavier bateu o martelo:
- Você não sabe o que tem aqui.
A futura professora de Evangelho nem quis saber. Concordou.
Durante seis meses, espíritas da Comunhão Espírita Cristã ajudaram Olina, analfabeta, a ensinar as lições de Kardec aos pobres da vizinhança. Ela ainda se esforçava para aprender a doutrina, quando sua mãe morreu. O velório seria às 13h30. Dez minutos antes, Chico chegou sozinho, aproximou-se da cama onde o corpo da morta estava, rezou e disse:
- Sua mãe foi direto.
- Direto como?
Olina ainda tateava naquele mundo estranho. Chico precisou entrar em detalhes, O espírito de sua mãe tinha subido aos céus sem sofrer qualquer resistência. Ao contrário de muitos outros, não ficou preso à Terra, sem se conformar ou sem acreditar na própria morte.
Olina ficou impressionada.
Chico deu outra notícia a ela. Sua mãe, antes de ir, pediu para ter o corpo velado sobre a mesa onde se realizavam as sessões espíritas. Olina concordou. Chico enrolou um lençol em volta do cadáver, segurou uma das pontas do pano e, com a ajuda do marido de Olina, levou a morta para o barracão no quintal. Em seguida, abriu o Evangelho, se sentou no banco de madeira comprido, ao lado do corpo, e iniciou a leitura.
Olina ficou a seu lado.
Enquanto lia, Chico se afastava em direção à outra extremidade. A cada página, ele ficava mais distante de onde tinha se sentado. Olina o acompanhava. No final, Chico e sua companheira já estavam de pé, do outro lado. O banco ficou para os espíritos.
Chico se despediu às 15h, deu um beijo na testa de Olina e disse:
- Não precisa se preocupar com nada. Meus amigos vêm fazer companhia a você.
O parceiro de Waldo Vieira estava cada vez mais seguro. Firme, ele tomava decisões, defendia suas idéias, exigia disciplina de seus auxiliares. Estava cada dia mais parecido com Emmanuel. Não sentia mais tanta necessidade de atribuir ao seu guia a responsabilidade pelos próprios atos. Já era capaz de dizer:
- Posso ser uma besta espírita, pois transporto os textos dos benfeitores espirituais, mas não sou um espírita besta.
Chico era respeitado e obedecido. Naquela noite, quatro de seus amigos chegaram à casa de Olina com pães, roscas, leite e café. Ficaram em volta do corpo da mãe de Olina, lendo o Evangelho, madrugada adentro. Na tarde seguinte, voltaram com um carro e, ao lado de outros companheiros, levaram o corpo até o cemitério.
Chico não apareceu.
Olina foi até ele, um dia depois, na Comunhão Espírita Cristã.
Chico a convidou a tomar parte na mesa. Era uma honra. Ficou ali, ao lado do espírita mais importante do país, durante três anos.
Três meses após o enterro da mãe de Olina, Chico Xavier anunciou a decisão para a ex beata:
- Vamos inaugurar um centro em sua casa.
No dia 21 de agosto de 1960, ele comandou a festa de inauguração da Casa de Sheilla. Olina ficou entusiasmada. As garrafas com água, colocadas sobre a mesa para concentrar energias espirituais, assumiam consistência leitosa e fervilhavam. O perfume se espalhava por todos os cômodos vindo não se sabe de onde. Chico anunciou em discurso, após colocar no papel um texto assinado por Emmanuel e outro por Sheilla:  "Lá, na Comunhão Espírita Cristã, está a cabeça, Emmanuel. Aqui, está o coração, Sheilla  ".
Foi um inferno. A vida de Maria Olina mudou e, nas primeiras semanas, piorou. A nova espírita da praça passou a ser surpreendida por um fantasma, todas as noites, quando iniciava as rezas antes de dormir. O visitante do além passava um pano áspero sobre o seu rosto e dizia:
- Isto aqui é o resto da mortalha.
Ela via o vulto, escutava a voz e gritava. Seu marido, sempre tão paciente com as noitadas espíritas da mulher, começou a perder a calma.
- Você está ficando maluca - dizia ele.
Olina dizia o mesmo para Chico. Tinha medo de enlouquecer.
Chico ria e, com jeito de Emmanuel, afirmava, nada consolador:
- Isto é só o começo.
Não estava exagerando.
Um coro de vozes sem rosto começou a cercar Maria Olina.
As assombrações exigiam a presença dela em cidades vizinhas, onde doentes estariam à sua espera. Chico deu nova orientação:
- Quando mandarem você ir a algum lugar, diga para eles virem para cá. Daqui você não sai.
Olina seguiu o conselho e, de repente, sua casa ficou repleta de gente. Em 1960, o centro virou albergue noturno e passou a abrigar hóspedes pobres das cidades vizinhas, sem dinheiro para comer, morar ou se tratar. Naquele ano, ela ajudou nada menos que 82 pessoas. No início, pensou em pedir doações para atender aos necessitados, mas Chico tirou a idéia de sua cabeça. As ajudas viriam espontaneamente. Ela não deveria fazer campanhas. Sem saber como, Olina saía às ruas, às vezes desesperada sem ter o que dar de almoço para seus hóspedes, e voltava com frutas, legumes, pães doados pelos vizinhos pobres.
Era mesmo só o começo.
No dia 20 de março de 1961, o albergue começou a se transformar em ambulatório. Com a ajuda do médico Waldo Vieira, de seu colega Eurípedes Tahan Vieira e de Chico Xavier, e com a   "supervisão espiritual  " da enfermeira do outro mundo, Sheilla, ela abriu as portas de seu barracão aos queimados. O mau cheiro tomou conta do local.
As vítimas de queimaduras, muitas delas de terceiro grau, todas pobres, eram acomodadas no chão pelos cômodos. Água boricada e água oxigenada se espalhavam pelas prateleiras.
Olina ouvia a voz da enfermeira alemã, seguia instruções vindas do nada e, mesmo sem saber ler, encontrava no escuro o remédio capaz de atenuar a dor dos pacientes. Com os olhos arregalados, um tanto em pânico, ela varava as noites ao lado dos moribundos e rezava para nenhum deles morrer. Cometia heresias como tratar das feridas com água, desobedecia recomendações médicas quando elas demoravam a surtir efeito, e conseguia resultados animadores.
No primeiro ano, atendeu a dezoito casos, alguns deles perdidos. Uma das vítimas tinha ateado fogo ao próprio corpo com álcool. Olina examinou os ossos expostos, a pele macilenta, e escutou a voz de Sheilla:
- Lave só com água fluidificada.
Após quatro enxaguadas, o corpo começou a cicatrizar. Olina escutava as gargalhadas de sua guia. Nunca viu seu rosto. Em doze anos, atendeu a quase mil pacientes.
Apenas trinta morreram. Olina chorava e cuidava do enterro.
De um dia para o outro, tudo acabou, sem explicações. O perfume de Sheilla desapareceu, sua risada também, a enfermaria foi desativada cinco anos depois.
Olina contratou uma professora particular e estudou até o segundo ano primário. O centro continuou no mesmo lugar, sempre aberto, com passes e divulgação do Evangelho, sessões de desobsessão às sextas, ciclo de estudos às terças e sopa para todo mundo aos sábados.
Olina nunca perguntou a Chico Xavier por que Sheilla desaparecera. Quase vinte anos após o sumiço de sua "orientadora ", ela entrou na fila no centro de Chico Xavier para receber seus passes e ele se negou a atendê-la. Com um riso no rosto disse:
- Epa, esta aí é a Sheilla.
Um leve perfume ficou no ar.
Chico Xavier também mudou a vida de Aparecida Conceição Ferreira, uma enfermeira do Setor de Isolamento da Santa Casa de Misericórdia. Especializada no tratamento de doença contagiosa, ela deu os primeiros passos em direção ao desconhecido antes mesmo de conhecer o fenômeno de Pedro Leopoldo. No dia 8 de outubro de 1958, Aparecida abandonou o emprego para acompanhar doze vítimas de pênfigo foliáceo, o fogo selvagem.
Com os corpos cobertos de bolhas, muitas delas transformadas em crostas, elas receberam alta do hospital sem qualquer perspectiva de cura. A direção considerou o tratamento longo e caro demais.
A enfermeira, inconformada, pediu demissão e saiu pelas ruas da cidade em busca de abrigo para as vítimas da doença inexplicável. Febris, algumas com os pés descalços, elas deixaram um rastro de sangue pelas calçadas e terminaram a via crúcis sem ter onde ficar. As pessoas apenas olhavam para o grupo e aceleravam os passos, sem conseguir disfarçar o nojo.

CONTINUA AMANHÃ

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