quinta-feira, 26 de maio de 2011

AS VIDAS DE CHICO XAVIER - HUMBERTO DE CAMPOS - O ESCÂNDALO - PARTE 6

CONTINUAÇÃO

Em pouco tempo, convenceu um médium de catorze anos, Florence Cook considerada um fenômeno na época , a se submeter a testes em sua casa, com a assessoria de sua mulher. O relatório escrito pelo cientista, e publicado quatro anos depois, era quase uma heresia.
A adolescente, quando em transe, liberava tanto ectoplasma que dava vida a uma outra forma feminina Kate King -, capaz de andar e falar por mais de duas horas seguidas.
Florence era baixa e morena. Kate era alta, loura e tinha 35 anos. O relato era minucioso e apresentava até as pulsações, completamente diferentes, da viva e da morta. Para arrematar, Crookes, anexou à sua narrativa 48 fotografias.
Muitas experiências de Pedro Leopoldo também foram fotografadas. Empolgado com os fenômenos, Chico Xavier transformou seu quarto em cabine e o emprestou a Peixotinho.
As aparições, lideradas por Sheilla - uma enfermeira alemã morta na Segunda Guerra, autorizaram as fotos. E a cabine, antes indevassável, foi aberta ao fotógrafo Henrique Ferraz Filho.
O médium carioca ficava deitado na cama estreita de Chico, inconsciente. O ectoplasma, expelido de sua boca e ouvidos, assumia forma humana e adquiria voz. Quando Henrique disparava o flash, não via nada ou ninguém diante dele. Mas, ao revelar o filme, a aparição estava lá.
Na noite de 2 de maio, a Rolleyflex registrou o corpo estranho de um senhor carrancudo envolto em uma espécie de manto vaporoso. No verso da fotografia, Chico Xavier escreveu:
“Na cabine habitual das sessões de materialização, tivemos a felicidade de receber a visita do irmão Camerino, desencarnado na cidade de Macaé... Francisco Cândido Xavier.”
Ninguém conseguiu provar a existência de truques nas sessões de materialização em Pedro Leopoldo nem de montagem nas fotos. Chico "assinou embaixo" de várias delas.
Na época, ele já era considerado por milhares de pessoas uma testemunha acima de qualquer suspeita.
Até sua família se espantava com tanta popularidade e credibilidade. O rapaz atormentado por vozes e visões, o ex réu do processo Humberto de Campos, cresceu, apareceu e começou a se transformar em mito.
Em 2 de abril de 1950, Chico Xavier comemorou seus quarenta anos com uma festa de inauguração concorrida. Naquele dia, o Centro Luiz Gonzaga mudou de sede. Já não cabia mais na casa de José Felizardo Sobrinho e se transferiu para a casa onde o aniversariante tinha nascido. O quarto miúdo de Maria João de Deus, local do parto, virou sala de passes. Convidados de vários estados lotaram o salão recém pintado e reformado com a ajuda de Rômulo Joviano. A badalação em nada lembrava aquela reunião íntima que inaugurou o primeiro centro espírita de Pedro Leopoldo, em 1917.
Espíritas de São Paulo, Belo Horizonte, Juiz de Fora, Rio de Janeiro e Sabará marcaram presença e fizeram discursos entusiasmados. Até um representante do Clube de Jornalistas Paulista apareceu para homenagear o tema de tantas reportagens polêmicas. Após ouvir elogios e mais elogios, Chico colocou no papel um texto assinado por Pedro d'Alcântara, ou melhor, Dom Pedro II.
Em Rogativa ele pedia a bênção de Deus ao lar erguido às dores ao refúgio para os sofredores.
Nem tudo era só espírito. Naquele ano, o novo integrante do time dos quarentões tomou uma decisão frugal: deixaria de jantar. Seus quase noventa quilos eram inadequados para seu 1,64m de altura. A taxa de colesterol também começava a pesar. Chico Xavier começou a cuidar do corpo. Mais tarde, cuidaria da calvície.
Em 1951 ele foi surpreendido por uma hérnia estrangulada. A cirurgia, à altura do peritônio, era inadiável e arriscada. Um médico providenciou a internação imediata.
Chico não contou nada à família, na época às voltas com dificuldades financeiras graves. A operação durou cerca de quatro horas. Enquanto convalescia, ele pensava em como pagar a conta. Dessa vez, nem puxou conversa com Emmanuel.
Logo nos primeiros dias, recebeu a visita de uma desconhecida muito bem vestida. Ela conversou com ele durante alguns minutos, procurando animá-lo, e, ao se retirar, deixou na sua mão, discretamente, um envelope. Pediu para o doente aceitar aquela contribuição e comprar frutas. Chico agradeceu, mas não abriu o envelope de imediato, O médico passou pela visitante e a cumprimentou um tanto constrangido. Em seguida, perguntou a Chico se ele a conhecia. Diante da resposta negativa, explicou: era uma prostituta famosa nas altas rodas da cidade. No envelope, Chico encontrou dinheiro suficiente para pagar a cirurgia.
Em poucos dias, o doente já estava de pé, pronto para outra. Bem humorado, recebeu uma visita ilustre no Centro Luiz Gonzaga: o professor italiano Pietro Ubaldi, autor de um dos livros de cabeceira de Chico na época, A Grande Síntese. O anfitrião surpreendeu o visitante com uma série de revelações. A mãe dele, Lavínia, já morta, estava ali e, após abraçar o filho, se referiu a ele como mio garofanino (meu pequeno cravo). Ubaldi confirmou o apelido de infância. Em seguida, Chico assinalou a presença do filho do escritor, Franco Ubaldi, morto na Segunda Guerra, no norte da África.
Tudo ia muito bem até o momento em que o mineiro anunciou a presença do espírito de uma irmã do professor, Maria.
Ubaldi se desculpou e, sem graça, garantiu: ele tinha mesmo uma irmã com este nome, mas ela estava viva na Itália. Chico ficou em silêncio. A hesitação durou segundos.
Tempo suficiente para o mineiro trazer uma explicação do além: Maria era o nome de outra irmã sua, mas ela tinha morrido quando ele ainda era bebê. Ubaldi se lembrou, aliviado. Teve sorte.
Exatos vinte anos depois, Chico criaria o mesmo constrangimento ao anunciar ao presidente da Federação Espírita do Paraná, João Guignone:
- Sabe quem está aqui ao meu lado, cheia de emoção e querendo abraçá-lo? Sua mãe.
Para não contrariar, o rapaz fingiu alegria. E confidenciou a um amigo:
- Chico não está regulando bem. Minha mãe está viva em Curitiba.
Ao chegar ao hotel, recebeu um interurbano do Paraná. O enterro estava marcado para a manhã seguinte.
Durante dois anos, 1952-53, Chico resolveu experimentar emoções mais fortes.
Ele mesmo decidiu emprestar seu ectoplasma aos visitantes do além. As reuniões de materialização movimentavam, em geral, a casa de André Xavier, seu irmão. Chico se deitava na cama em um quarto próximo à sala, as rezas começavam, a música enchia a sala e o desfile de aparições surpreendia os espectadores. As criaturas iluminadas eram mais etéreas, menos sólidas, do que as geradas por Peixotinho em seus espetáculos.
Numa das noites, um dos espectadores e amigos de Chico, Arnaldo Rocha, recebeu a visita de Maria José de São Domingos Ramalho Rocha, sua mãe.
Quando viva, ela tratava os filhos como vidrinhos de cheiro e tinha a mania de pousar as mãos na cabeça deles. Em sua versão fluorescente, ela repetiu os hábitos estranhos. O filho quis saber se ela conservava também a mania de cheirar rapé. A aparição riu, negou e mostrou a tabaqueira vazia.
Em outra noitada, uma senhora fulgurante, coberta por véus, saiu do cubículo onde estava Chico e iluminou a sala de visitas com uma jóia fosforescente. André Xavier identificou a recém chegada: era Cidália, mãe dele, segunda mulher de João Cândido. Antes de sair, a madrasta de Chico deixou um rastro de perfume no ar. De repente, uma nova fragrância invadiu a sala e uma figura elegante entrou em cena. Era Meimei, ex mulher de Arnaldo. Ela cumprimentou a todos e pediu que a pessoa necessitada" se aproximasse.
Um jovem tuberculoso se levantou da cadeira. A aparição envolveu seu peito com cordões fosforescentes. A radioatividade, livre dos efeitos negativos do rádio, poderia curar. Em seguida, um sujeito com pose austera, enfiado numa toga romana de tonalidade azul, surgiu na sala com uma tocha acesa numa das mãos. Em tom grave, afirmou:
- Amigos, o que acabastes de ver e de ouvir representa maiores responsabilidades sobre os vossos ombros.
Era Emmanuel.
Logo, ele sumiu e abriu alas para nova onda de perfumes. A recém chegada era bem mais atraente e simpática. Loira, jovial, respondia pelo nome de Sheilla e falava com forte sotaque alemão. Um dos espectadores, diante da enfermeira morta na Segunda Guerra, tratou de fazer uma consulta médica:
- Eu me sinto mal.
- Você come muita manteiga.
Ela pediu que o paciente levantasse a camisa. Iria fazer uma radiografia do seu estômago.
Sheilla se aproximou e, com os dedos semi abertos, apalpou a região do estômago em sentido horizontal. Os espectadores ficaram perplexos. De repente, a barriga do paciente ficou transparente e todos puderam ver suas vísceras em funcionamento.
Sheilla se limitou a informar:
-Agora levarei a radiografia ao Plano Espiritual para que a estudem e lhe dêem um remédio.
A enfermeira promovia espetáculos impressionantes. Numa noite, duas senhoras, uma cardíaca e outra portadora de câncer, foram atendidas por ela em sessão.
Uma lâmpada de 26 velas mal iluminava a sala. De repente, duas pequenas bolas de luz se distenderam e formaram mantilhas que flutuaram no ar e pousaram, uma sobre a Cabeça da cardíaca e a outra sobre os ombros de sua companheira. Uma das testemunhas do fenômeno, Wallace Leal Rodrigues, pediu licença para tocar nos véus.
Tinham a textura de filó, uma claridade azulada e foram absorvidos pelos corpos das doentes.
Em 1953, Chico estava na cabine quando a sala foi iluminada por uma espécie de relâmpago. Uma aparição com quase 1,90m de altura, porte atlético e tórax largo, entrou em cena. Trazia na mão direita, erguida, a velha tocha acesa (um símbolo de fé).
Com voz clara, baritonada, encheu o peito e afirmou:
- Amigos, a materialização é fenômeno que pode deslumbrar alguns companheiros e até beneficiá-los com a cura física. Mas o livro é chuva que fertiliza lavouras imensas, alcançando milhões de almas. Rogo aos amigos a suspensão destas reuniões a partir desse momento.
Era ele mesmo. Emmanuel.

CONTINUA AMANHÃ

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