quarta-feira, 20 de abril de 2011

JUSTIÇA DIVINA - ESTUDOS SOBRE AS OBRAS DE ALLAN KARDEC - 26ª PARTE

FRANCISCO CANDIDO XAVIER

JUSTIÇA DIVINA

ESTUDOS E DISSERTAÇÕES EM TORNO DA OBRA


“O CÉU E O INFERNO”


De ALLAN KARDEC

Ditado pelo Espírito EMMANUEL


74 - CONTRA SENSOS

Quando a gota se viu semelhante a uma gema valiosa, na folhagem da primavera, insultou o rio em que se formara: Sai da frente, monstro do chão.

Quando o tronco se agigantou diante do firmamento, blasfemou contra a própria raiz: Não me sujem os pés.

Quando o vaso passou pela cerâmica em que nascera, gritou revoltado: Não suporto essa lama.

Quando o ouro se ajustou ao palácio, indagou da terra que o produzira: Que fazes aí, barro escuro?

Quando a seda brilhou, na pompa da festa, disse à lagarta que lhe dera existência: Não te conheço, larva mesquinha.

Quando a pérola fulgiu, soberana, exigiu da ostra em que se criara: Não te abeires de mim.

Quando o arco-íris se reconheceu admirado pelo pintor, acusou o sol de que se fizera: Não me roubes a luz.

Copiando esses contra sensos figurados da natureza, o homem insensato, quando erguido ao pedestal do orgulho pelos abusos da inteligência, costuma escarnecer de si próprio, afirmando jactancioso: A vida é poeira e nada, e Deus é ilusão.

75 - CRENÇAS


Declara Allan Kardec: “A crença é um ato de entendimento que, por isso mesmo, não pode ser imposta”.

E ousamos acrescentar que isso ocorre, porquanto cada consciência cultiva a fé segundo o degrau evolutivo em que se coloca ou de conformidade com a posição circunstancial em que vive.

Não seria justo violentar o cérebro da criança, ao peso de indagações filosóficas, porque lhe não aceitemos as convicções infantis. Faz-se imperioso ouvi-la com paciência, guiando-lhe os raciocínios para os objetivos da lógica.

É crueldade censurar o náufrago porque se agarre à tábua lodosa, provisoriamente incapaz de partilhar-nos a embarcação confortável. Ao invés disso, é forçoso lhe estendamos concurso fraterno.

Excessos dogmáticos, lances de fanatismo, opiniões prepotentes, medidas de intolerância e injúrias teológicas podem ser hoje consideradas por enfermidades das instituições humanas, destinadas a desaparecer com a terapêutica silenciosa da evolução e do tempo, embora constituam para todos nós, os espíritas-cristãos encarnados e desencarnados, constantes desafios a mais amplo serviço na sementeira da luz.

Sabemos que a individualidade consciente é responsável pelos próprios destinos; que a Lei funciona em cada espírito, atribuindo isso ou aquilo a cada um, conforme as próprias obras; que Deus é o Infinito Amor e a Justiça Perfeita, e que as forças do Universo não acalentam favoritismo para ninguém. Todavia, conquanto sustendo a fé raciocinada, nos alicerces do livre exame, cabem-nos, sem qualquer atitude louvaminheira para com os tabus e preconceitos que ainda enxameiam no campo religioso da Terra, o dever de clarear o caminho dos nossos irmãos de humanidade, em bases de auxílio, de vez que o Criador concede à criatura os meios indispensáveis para que efetue por si mesma a própria libertação.

É por isso que Jesus proclamou: “Conhecereis a verdade e a verdade vos fará livres”.

Não disse o mestre que o mundo já conhecia a verdade, nem precisou a ocasião em que a verdade será geralmente conhecida entre os homens. Mas dando a entender que a verdade é luz divina, conquistada pelo trabalho e pelo merecimento de cada um, afirmou, simplesmente: “conhecereis”.

76 - ANJOS DESCONHECIDOS


Há guardiães espirituais que te apóiam a existência no plano físico e há tutores da alma que te protegem a vida mesmo na Terra.

Freqüentemente centralizas a atenção nos poderosos do dia, sem ver os companheiros anônimos que te ajudam na garantia do pão.

Admiras os artistas renomados que dominam nos cartazes da imprensa e esquecem facilmente os braços humildes que te auxiliam a plasmar, no santuário da própria alma, as obras-primas da esperança e da paciência.

Aplaudes os heróis e tribunos que se agigantam nas praças; todavia, não te recordas daqueles que te sustentaram a infância, de modo a desfrutares as oportunidades que hoje te felicitam. Ouves, em êxtase, a biografia de vultos famosos e quase nunca te dispões a conhecer a grandeza silenciosa de muitos daqueles que te rodeiam, na intimidade doméstica, invariavelmente dispostos a te estenderem generosidade e carinho.

Homenageia, sim, os que te acenam dos pedestais que conquistaram, merecidamente, à custa de inteligência e trabalho; contudo, reverencia também aqueles que talvez nada te falem e que muito fizeram e ainda fazem por ti, muitas vezes ao preço de sacrifícios pungentes.

São eles pais e mães que te guardaram o berço, professores que te clarearam o entendimento, amigos que te guiaram à fé e irmãos que te ensinaram a confiar e servir... Vários deles jazem agora, na retaguarda, acabrunhados e encanecidos, experimentando agoniada carência de afeto ou sentindo o frio do entardecer; alguns prosseguem obscuros e devotados, no amparo às gerações que retomam a lide terrestre, enquanto outros muitos, embora enrugados e padecentes, quais cireneus do caminho, carregam as cruzes dos semelhantes.

Pensas nesses anjos desconhecidos que se ocultam na armadura da carne e, de quando em quando, unge-lhes o coração de reconhecimento e alegria. Para isso, não desejam transfigurar-se em fardos nos teus ombros. Quase sempre, esperam de ti, simplesmente, leve migalha das sobras que atiras pela janela ou uma frase de estímulo, uma prece ou uma flor.

77 - LUGARES DE EXPIAÇÃO


Múltiplas são as conceituações dos infernos exteriores.

Para os hindus de várias legendas religiosas da antiguidade, a região do sofrimento, para lá do sepulcro, dividia-se em dezenas de seções, nas quais os Espíritos culpados experimentavam os martírios do fogo e da asfixia, dos botes de serpentes e aves famélicas, de venenos e martelos, lâminas e prisões.

Entre os chineses, acreditava-se que os condenados, após o decesso, atravessavam privações e torturas, até caírem, exaustos, numa espécie de segunda morte, com o suposto aniquilamento do próprio ser.

Egípcios possuíam aparatosos regimes de corrigida para os mortos que fossem implacavelmente sentenciados a penas aflitivas, sob os vistas de Anúbis.

A crença popular grega admitia a existência de abismos insondáveis, além-túmulo, onde os maus eram atormentados por agonias cruéis.

E, seguindo por vasta escala de concepções, a teologia relaciona infernos hebraicos, persas, romanos, escandinavos, mulçumanos e ainda os que são até hoje perfilhados pelos diversos departamentos da atividade cristã.

Não ignoras que os sistemas de castigo, mentalizados para depois da morte, obedecem às idiossincrasias de cada povo, apresentando, por isso, variedades multiformes. E sabemos igualmente, em Doutrina Espírita, que existem outros infernos exteriores, a cercar-nos na Terra, entre os próprios espíritos encarnados.

Não longe de nós, vemos o inferno da ignorância, em que se debatem as inteligências sequiosas de luz, o inferno das necessidades primárias absolutamente desatendidas, o inferno dos entorpecentes, o inferno do lenocínio, o inferno do desespero e o inferno das crianças desamparadas, todos eles gerando os suplícios das sombras e da loucura, do pauperismo e da enfermidade, do abandono e da delinqüência.

Em razão disso, embora respeitando as crenças alheias, observemos as próprias ações, a fim de verificar o que estamos fazendo para extinguir os infernos que nos rodeiam.

E, sobretudo, aprendendo e servindo, vigiemos o coração para que a prática do bem nos garanta a consciência tranqüila, de vez que todos somos responsáveis pela nossa própria condição espiritual.

Disse-nos o cristo: “O reino de Deus está dentro de vós”, ao que, de acordo com ele mesmo, ousamos acrescentar: e o inferno também.

CONTINUA AMANHÃ

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